Vereadores ameaçam não votar novas suplementações de crédito

No entanto, mesmo cientes das falhas, aprovaram por unanimidade projeto da Prefeitura

 

Matheus Augusto

Prefeitura e Câmara podem estar diante de um novo impasse. Vereadores da Câmara de Divinópolis ameaçam não votar projetos de suplementação financeira do Executivo caso as propostas continuem a ser enviadas agrupadas e sem a devida explicação. As críticas foram reforçadas na última quinta-feira, quando aprovou-se por unanimidade o Projeto de Lei EM 078/2022, que autoriza a abertura de R$ 12,4 milhões em três secretarias para fins distintos. 

Apesar da aprovação, os vereadores reprovaram a estratégia da atual Administração em agrupar, em um mesmo projeto, suplementações para pastas e finalidades diferentes em vez de elaborar proposições isoladas para cada demanda. No entanto, aprovaram a matéria por unanimidade.

A Prefeitura se disse aberta ao pedido, mas advertiu sobre o risco de lentidão nos processos. 

O que diz o texto

O projeto EM 078/2022, aprovado na última quinta, solicita autorização para a abertura do Crédito Adicional Suplementar de R$ 12,4 milhões. O recurso, explica o Executivo, é excesso de arrecadação. O texto prevê a aplicação do montante em três secretarias — Educação, Trânsito e Serviços Urbanos. 

  • Educação: fortalecimento de dotação orçamentária para folha de pagamento do ensino fundamental infantil, jovens e adultos, e educação especial, além do auxílio alimentação e transporte; 
  • Trânsito, Segurança Pública e Mobilidade: aporte para assistência financeira ao transporte coletivo destinado a auxiliar o custeio da gratuidade das pessoas idosas, conforme artigo 2º da Portaria 09/2022, instituída pela Emenda Constitucional nº 123/2022; 
  • Operações e Serviços Urbanos: custeio de iluminação pública.

O que dizem os vereadores

Os parlamentares expressaram contrariedade com projetos que destinem recursos para secretarias diferentes e aplicações distintas. A crítica já havia sido vocalizada pelos vereadores durante a votação da complementação orçamentária para o pagamento dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e de Combate à Endemias (ACE). Edis defenderam que a proposta deveria ter sido apresentada isoladamente, enquanto o Executivo elaborou o projeto com outras demandas, como os repasses para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e o Complexo de Saúde São João de Deus (CSSJD). Na época, o vereador Roger Viegas (Republicanos) chegou a sugerir que a estratégia era utilizada pelo governo para “forçar” a aprovação de outras questões contidas no texto base que não estavam ligadas ao tema principal. No referido caso, dos R$ 16 milhões, apenas cerca de R$ 6 mi eram destinados aos salários dos servidores. 

Para o vereador Josafá Anderson (Cidadania), o formato prejudica a análise de tópicos mais complexos. 

— Votei favorável porque dentro deste projeto tem alguns pontos necessários. Todavia, está virando moda o Executivo mandar para esta Casa, dentro de um pacote só, alguns pontos que precisam ser melhor analisados — justificou.

Ainda de acordo com o vereador, cabe ao Legislativo dar autonomia às comissões temáticas, responsáveis pelos pareceres, para isolar demandas diferentes dentro do mesmo projeto.

— Esta Casa tem que retomar o poder de legislar e fiscalizar. As comissões temáticas têm que ter um maior poder e força, e não ser simplesmente uma roda de bate-papo. Ela tem que ter efetividade. Temos que criar mecanismos para desmembrar os projetos quando eles chegarem da maneira que chegou. Está virando a “Casa da mãe Joana” — repudiou.

O vereador Ney Burger foi claro ao defender sua posição: não assinará inclusões futuras de mesma natureza.

— Faço das palavras do Josafá as minhas. Assinei essa inclusão e já vou deixar bem claro que assinei porque a gente vê muita coisa precisando, mas tem muita coisa com ponto de interrogação. Infelizmente, eu fiquei meio assim porque eu não vi ninguém explicando nada. Já vou adiantar: não vou assinar mais nenhuma inclusão onde vai juntar duas ou três secretarias, não vou assinar mais. Não adianta vereador virar a cara ou muito menos o Executivo, não vou assinar mais — reforçou.

Ney cobrou explicações claras e detalhadas sobre a aplicação dos recursos, e fez coro à cobrança de comissões temáticas mais atuantes na questão.

— Se não vier bem claro para mim antes, não vou nem assinar nem votar. Essa de hoje [quinta] já ficou meio assim, mas eu votei porque a gente vê que tem muita coisa precisando, mas em outras ficamos preocupados — frisou.

Transparência

Outro a integrar o grupo crítico à situação foi Rodyson do Zé Milton (PV). Ele citou que o projeto aprovado destina, ao todo, R$ 12 milhões para três pastas e gastos distintos. 

— São matérias de natureza diferentes. Isso aqui pode prejudicar muito a transparência — justificou.

Rodyson prometeu um trabalho legislativo mais técnico e jurídico nas próximas análises, e lamentou a falta de articulação do Executivo para explicar o projeto.

— Deste jeito, está muito amarrado. (...) Nem mesmo o líder do governo fez uma defesa do projeto — citou. 

Ele contou ter conversado com o secretário de Serviços Urbanos, Gustavo  Mendes, que o explicou sobre a importância do recurso para a pasta. No caso, relatou aos presentes, o valor é referente ao pagamento de serviços já prestados ao Município. 

Por fim, Rodyson pediu à atual Administração que envie as demandas orçamentárias desmembradas. 

— Não vai ser mais aprovado projeto de suplementação com várias rubricas em um só projeto — concluiu. 

Do mesmo partido do prefeito, Ana Paula do Quintino (PSC) também criticou o envio em “bloco” das destinações orçamentárias. 

— Por favor, mandem separado. (...) Para votar, fica mais fácil — pediu.

Ela justificou a solicitação como forma de facilitar o esclarecimento de possíveis dúvidas sem prejudicar o trâmite de todos os demais recursos previstos no texto. 

— Não estou duvidando da idoneidade deste dinheiro — ressaltou. 

Informação

Diante das críticas, o presidente da Câmara, Eduardo Print Jr (PSDB), informou aos vereadores e suas assessorias que outros três projetos de suplementação tramitam em regime de urgência. Para evitar novos desconfortos públicos na relação entre os dois poderes, ele pediu aos edis que se informem sobre os projetos em trânsito e busquem os esclarecimentos necessários. 

— Peço às assessorias o cuidado de fornecer as informações necessárias a vossas excelências para que possam ser aprovados nos próximos dias — afirmou, ao encerrar o debate. 

Posicionamento

Ao Agora, a Prefeitura informou que o procedimento adotado pela atual Administração é "exatamente o que vem sendo executado ao longo de anos, por diversas gestões antecedentes e, tecnicamente, não padece de qualquer vício ou impedimento". Ressaltou, ainda, nos casos mencionados, não tratar-se de criação de despesas, mas apenas de recursos não previstos inicialmente no Orçamento.

— Isso ocorre, comumente, na hipótese de superávit financeiro, excesso de arrecadação ou anulações de outras dotações, quando a estimativa inicialmente prevista na Lei Orçamentária não é suficiente, diante da receita e das despesas a serem executadas. É muito comum na área da Assistência Social, da Educação e da Saúde, diante de repasses dos Governos Estadual e Federal, que podem superar aqueles estimados inicialmente para o orçamento vigente, exigindo-se a necessidade de adequar as dotações correspondentes — argumentou.

Em determinados casos, cita a Prefeitura, a paralisação do trâmite do Projeto de Lei para a abertura de crédito suplementar pode “repercutir em impedimento à execução de despesas públicas, por exemplo, a realização de determinada política pública, serviço e até mesmo de pagamento salarial”.

De acordo com o governo Municipal, a prática de inserir créditos diversos num mesmo projeto tem como objetivo dar eficiência à sua aprovação múltipla. 

— A inclusão de fichas orçamentárias diversas num único projeto de lei visando à obtenção da autorização legislativa para abertura de crédito especial se dá por mera eficientização dos procedimentos e evitar um projeto para cada dotação orçamentária que se pretenda reforçar, já que individualmente discriminada cada ficha e respectivas fontes — justificou.

No entanto, a Prefeitura não descarta atender o pedido dos vereadores. Seria necessário, porém, a oficialização, via ofício ou notificação, por parte do presidente da Câmara, solicitando a individualização dos processos. O alerta, no entanto, fica para a possível lentidão nos processos e o risco de prejudicar ou atrasar compromissos financeiros.  

— (...) apesar de representar desdobramentos desnecessários e o aumento do número de processos e projetos de leis, não haverá qualquer objeção por parte desta Gestão Municipal para que sejam encaminhados projetos individualizados por cada secretaria ou setor — conclui.

 

(Foto: Divulgação/CMD)

Presidente orientou vereadores se informarem sobre próximos projetos






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