Reconciliando com o divórcio

Acredito que tudo para dar certo precisa de uma mensagem clara que deve conter detalhes. Vocês podem achar que o prelúdio desse texto seria sobre uma possível reconciliação entre um casal que decidiu seguir a vida em caminhos opostos. Mas pretendo adentrar não somente no raso da situação, e sim no profundo das relações. Para entender o contexto será necessário perceber se você ou algum conhecido está inserido ou não no contexto que vou simular.  Confesso que o que transborda em mim, derramo nas linhas descritas. Contém afagos de uma alma cansada, intensa, resolvida e que carrega consigo o sentimento mais nobre que interliga o tempo e as emoções. Uma mente amadurecida com os embates da técnica profissional e das experiências pessoais.  Para ser mais exata, com muita clareza surge em minha memória a história de Marx. Esse foi um homem odiado. Os burgueses, tanto ultrademocratas, quanto os conservadores lançaram os republicanos e o expulsavam. Competiam e lançavam difração sobre ele. Marx foi deixado de lado como teia de aranha, porém ele foi maior que tudo isso. Certamente porque o que diziam a seu respeito era mentira, e não é necessário dizer que a palavra daquele que mente não possui peso, não deve incluir na balança moral, na estima que você tem pelo outro. Marx morreu pranteado por milhões de operários da causa revolucionária que como ele lutava. Foi venerado, querido, amado. E amado, mas injustiçado, caluniado e perseguido, mas amado, extraordinariamente amado. 

Agora sim, posso fazer uma analogia do final da história de Marx e com os resquícios e consequências da separação que acontece ao meio de confusões mentais, imaturidade, mentiras e despreparo. Quantos divórcios se mantêm vivos, ano após ano, em razão das mentiras, difamações, perseguições e até mesmo num jogo incansável de superego? O divórcio é uma das formas de dissolver o vínculo conjugal. Mas até quando o casal que se divorciou não se separa definitivamente?  Onde se encontra a linha tênue que separa o que nunca acabou? O maior desafio de uma reconciliação está na capacidade de engolir o orgulho, assumir os próprios erros e perdoar os fatos ocorridos no transcorrer do desgastante processo da separação. Asseguro aos leitores que as consequências geradas pelo divórcio podem ser mais avassaladoras que os motivos reais que conduziram o casal a se separar.    

 

Lamentavelmente, por orgulho e insegurança, muitos passam a vida com um profundo vazio por não terem tido coragem de assumir que a felicidade se encontrava exatamente perto do recomeçar sem retroceder, e que está naquela pessoa a metade do caminho que falta para ele percorrer. Ressalto que a reconciliação com o divórcio não requer uma nova vida como casal, requer um caminhar leve sobre uma situação que pode ser vista por outro viés. Não é necessário lutar uma vida para ser reconhecido como ‘Marx’ foi, mas pode ser libertador transformar os resquícios de um amor machucado pela beleza de um amor transformado. Marx precisou morrer para ser reconhecido e amado, mas não precisou morrer para ser perseguido e difamado. Talvez aí se encontra o segredo de não permitir um ecoar na eternidade sobre erros cometidos no passado, senão a reconciliação consigo mesmo. O luto deve ter fim, e talvez aconteça a partir do romper com o divórcio e ao mesmo tempo reconciliando consigo mesmo, reconhecendo os motivos que lhe conduziu a traçar as linhas da história. A verdade é que com o esforço de todos, os movimentos de gestos nobres só engrandecem, os filhos agradecem, e os corações definitivamente encontram paz para juntos ou separados seguirem as suas histórias.     

 

 

Por Flavia Moreira. Advogada, pós-graduada em Direito Público, Direito processual Civil, pelo IDDE em parceria com Universidade Coimbra de Portugal, ‘IUS GENTIUM CONIMBRIGAE, especialista em Direito de Família e Sucessões, associada ao IBDFAM e membro do Direito de família da OAB/MG.

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