Quando os discursos viram ações: violência contra mulher

Quando os discursos viram ações: violência contra mulher

Laiz Soares

A violência contra mulher cresce cada vez mais no Brasil. Quando abrimos o jornal, encontramos inúmeros casos de violência doméstica e feminicídios. Durante os dois últimos anos, em 20,3% dos municípios brasileiros, foi registrado aumento nas agressões físicas e verbais contra as mulheres.

Foram 50.056 mulheres assassinadas entre 2009 e 2019. Seria natural pensar que a sociedade encontra-se revoltada com os números dessa violência. Mas, ao contrário, vemos o aumento de agressores ganhando destaque público.

Essa crescente notoriedade não começou de repente, antes de essa violência ser banalizada por muitos, um discurso machista foi aceito nas redes sociais e nas mídias tradicionais. Quando discursos nocivos às mulheres são expressados por figuras públicas e por representantes de nossa política, mais agressores se sentem confortáveis para expressar sua violência, sem receio das consequências. 

 

Neste mês, por exemplo, Diecleyton Farley publicou uma live nas redes sociais logo após ter atirado contra a esposa e tê-la feito refém, ameaçando explodir a própria casa. 

O agressor não negou o crime e ainda se mostrou orgulhoso dele. Farley não só afirmou que sua esposa merecia o tiro, como disse que “fez o seu melhor” . Casos como o de Farley são cada vez mais frequentes, ainda neste ano vimos agressões serem filmadas pelas redes sociais e os agressores ganharam reconhecimento após os casos.

Há apenas um mês vimos as denúncias contra o vereador Gabriel Monteiro por assédio moral e sexual contra assessores e ex-funcionários e estupro de vunerável. Tais denúncias são de crimes hediondos que deveriam ser tratados como atrocidades – mas, ao contrário da repulsa da sociedade, Gabriel recebeu popularidade após os casos.

O vereador ganhou em um mês mais de 200 mil seguidores em rede social. Apenas no dia 31 de março, o ex-policial militar chegou a ganhar mais de dez mil. Hoje, o parlamentar tem 4,6 milhões de seguidores no Instagram.

Quando discursos machistas são aceitos pela população, atitudes e crimes machistas começam a ser aceitos também. A discriminação contra mulheres não é liberdade de expressão, e declarações que ofendam, difamem e desrespeitem as mulheres não devem ser tratadas como tal.

 

A luta contra a violência à mulher não começa pelas Delegacias de Defesa da Mulher. Apesar de sua importância, é preciso começar com ações de prevenção ao feminicídio e com mudanças na estrutura do machismo em nossa sociedade. A estrutura do machismo pode ser definida como “machismo estrutural'', conceito utilizado para descrever uma série de comportamentos que reforçam a ideia da mulher como objeto do homem, gerando desigualdades e violência entre homens e mulheres. Esse comportamento machista pode ser visto em diferentes estruturas da sociedade: família, trabalho e relações afetivas.

É papel do legislativo acompanhar os índices de violência contra a mulher na cidade, cobrar da Prefeitura ações concretas de prevenção e apoio às vítimas. Além disso, há uma série de políticas emancipadoras para as mulheres que podem ser feitas pelo Executivo local, como a construção de casas de abrigo para mulheres vítimas de violência doméstica, com programas de emancipação emocional e financeira dessas vítimas, procurando restabelecer sua saúde física e emocional e incluindo-as no mercado de trabalho, apoiando sua independência e emancipação financeira.

Outras ações importantes a serem endereçadas de forma coordenada como políticas públicas e iniciativas do Legislativo e do Executivo no âmbito municipal são a criação de central de denúncias, a capacitação das autoridades locais para lidar com vítimas de violência e fazer o cumprimento correto da lei Maria da Penha.

Laiz Soares é formada em relações internacionais e estudou administração e marketing na Essca na França. Fez formação executiva no Insper em relações governamentais no Brasil. Chefiou o gabinete da deputada federal Tábata Amaral e fundou o movimento “Nenhuma a Menos”.

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