Quais são os seus critérios para seu círculo de convivência?

 

‘A pessoa não é só o seu desejo, ela é ele e as suas circunstâncias’ 

Amo essa frase e posso remetê-la ao avanço legislativo que nós brasileiros podemos celebrar com a Lei de n. 14.713/23 que foi sancionada no transcorrer desta semana. A norma altera o Código Civil para proibir a fixação da guarda compartilhada em casos de violência doméstica, introduzido o art. 699.A no CPC, obrigando o juiz a indagar as partes e o Ministério Público (MP), antes de iniciada a conciliação em ações de guarda.

 Precisamos falar mais sobre violência doméstica e acirrar as consequências para combater os agressores. É preciso mais que isso, é necessário trabalhar na educação dos filhos e fomentar uma política de advertência no seio familiar, pois comprovadamente a maioria das mulheres que se envolvem, ignorando os sinais dos agressores são filhas de pais ausentes que deixaram de protegê-las e ressaltar os seus valores quando ainda criança. Muitas, em busca de aprovação e suprimento de carência, não estabelecem o critério da beleza de comportamento, deixando de colocá-los à prova, aceitando migalhas em relacionamentos afetivos. Por certo, há certas nobrezas que jamais serão postas à prova. Mas é nobre que você não se permita decidir por sentimentos evasivos na busca de preencher vazios existenciais que geram carências profundas.

Gosto muito da música “Bom conselho” de Chico Buarque. Ela diz muito. 

A sensação para a vítima da violência doméstica, quando despertada em tempo, pode ser como a de uma pessoa que, depois de dormir mais do que se esperava, acorda com a consciência da mesma infelicidade de quando fechara os olhos. 

Ocorre que, às vezes, nos decepcionamos com alguém e tudo que queremos é um motivo, uma razão, algum ponto para absolvê-la. Tudo porque no fundo você não queria viver aquela decepção. Quantas pessoas ficaram e ficam anos a fio presas em casamentos fracassados e mesmo posterior o divórcio alimentou ou alimenta o sonho de restaurar aquele casamento? Tudo porque alimenta ou alimentou a existência do que poderia ter sido e não no que a pessoa foi e É. 

A verdade é que as pessoas têm explicações para o que elas fazem e para o que elas não fazem, e as explicações não devem resultar necessariamente em uma absolvição. As pessoas têm explicações e essas explicações podem ser plausíveis ou mais ou menos, e você pode entender, acatar. Há uma frase que gosto muito e embora não recorde o autor ela diz o seguinte: ‘tudo que é humano não me é estranho’. 

Às vezes, a pessoa erra por falta de caráter, por inveja, por ganância, por ser orgulhoso, altivo ou por uma mentira, e você entende porque isso é próprio do ser humano. Entender e absorver é questão do bom senso e, às vezes, precisamos entender que a pessoa não é o pensamos que era e ela não serve para o nosso círculo restrito de convivência, não merece nosso amor. Quando é agressor, seja de qual natureza for, psicológico, física, patrimonial, ela sequer merece ter nuances da nossa vida privada. Consequentemente devemos cortá-la do nosso círculo de convivência.  

Sabemos que o que acaba com uma pessoa é um abalo emocional muito grande, este quando não tratado implica o desequilíbrio emocional constante na vida. A consequência de uma figura melancólica e doentia sempre tomará o lugar de um menino ou uma menina que era adorável, florescente e cheio de saúde. Se a pessoa não cuidar da saúde, terá de cuidar da doença, se não cuidar do casamento terá de cuidar do divórcio e as consequências dele, como por exemplo as delimitações que a lei impõe protegendo os filhos do próprio agressor, ainda que nele não haja intenção de ferir ou agredir o filho. Entende que a pessoa é quem escolhe qual cuidado terá?

Certa vez, ouvi dizer que a boa educação é mais indispensável ao bem-estar que o bom coração. Tem gente tão estressada, grossa, explosiva, que ofende, mas que tem bom coração. Entretanto, ao bem-estar do indivíduo a boa educação é mais indispensável que um bom coração. Você pode ter um coração lindo caro leitor, mas se você se encaixa nas características mencionadas últimas linhas em tela acima, eu lhe afirmo que ninguém aguenta mais a sua gritaria, a sua grosseria, suas explosões. Para o bem-estar é mais indispensável a boa educação que um bom coração. Afinal, um bom coração não é licença para ofender os outros. Reitero, entender o que conduz uma pessoa a agir como faz e absolvê-la é outra situação. A lei veio estabelecendo respaldo para integridade das vítimas de agressores, evitando que a violência velada se estenda aos filhos. 

Portanto, qual é a sua escolha? Qual o seu critério para conviver?

Por Flavia Moreira. Advogada, pós-graduada em Direito Público, Direito Processual Civil, pelo IDDE em parceria com Universidade Coimbra de Portugal, ‘IUS GENTIUM CONIMBRIGAE, especialista em Direito de Família e Sucessões, associada ao IBDFAM e membro do Direito de Família da OAB/MG.

 

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