Parentes por afinidade ou afinidade para ser parente?

O estilo de vida é contagioso, portanto, as escolhas que fazemos ao longo da vida irão diretamente influenciar em quem nos tornamos. Penso que o legislador ao aplicar o parentesco por afinidade, sabia que beneficiaria aqueles que juntamente com a legislação evoluiriam se tornando pessoas de fina estirpe. O artigo 1595, parágrafo 1 do Código Civil, afirma que o cunhado é o último parente colateral por afinidade existente no ordenamento jurídico brasileiro. O legislador, por questões morais e religiosas, decidiu estabelecer esse vínculo a fim inclusive de impossibilitar o casamento entre tais pessoas, ou seja, diante do divórcio ou da extinção da união estável, não será possível o casamento, por exemplo, entre sogra e genro e nem tampouco entre padrasto e enteada e tal previsão se encontra no art. 1.521, II. Você sabe que respiro um ambiente familiarista, em razão disso pude observar e constatar que as situações entre os familiares se repetem sempre. Parei indagando a mim mesma se as pessoas com que convivi anos atrás e de certa forma não me adequei, errei com elas e ou elas também erraram comigo, poderiam se tornar as mesmas pessoas com as quais eu conviveria hoje? Certamente, mas provavelmente eu teria uma maneira distinta de lidar. A maturidade nos favorece, pois nos ensina preservar nossa intimidade e respeitar o espaço do outro. Descobri que a solução está em mim e não no outro. Por certo que há pessoas com gênio difícil, donos de sua autossuficiência e jamais conseguirão reconhecer que também foram nocivas um dia, e aceitar que podem e devem ser respeitadas e consideradas. É preciso entender o outro de maneira que não o invada, é preciso buscar ter empatia e entender e reconhecer que ninguém é alecrim dourado. A vida tem suas mazelas, aceitar é uma virtude, modificá-las é uma arte. Saber que pode e deve ser melhor que ontem, e isso é grandioso para os que andam para frente sem preocupar com o retrovisor. É preciso aprender a não negar sentimentos lícitos que fazem a ponte entre seu hoje com o seu passado, visando a paz do seu presente e a transformação do futuro. Uma espécie de reset em nossa alma. Dias atrás eu disse a uma pessoa lembrando a mim mesma que ninguém precisa carregar lixo na alma. As relações de parentescos muitas vezes são marcadas por discórdia, ciúmes, mágoa, gerando a sensação de frustração quando não são adequadamente pontuadas. Ressignificá-la não tem a ver em se tornar melhor amigo. Situações que não são solucionadas encontram essas pessoas quando mais velhas e frustradas, tudo porque a vida delas foi mais complexa do que se imagina. Talvez, muitas vezes, porque faltou dedicação, faltou ênfase, faltou correr riscos, faltou engolir o orgulho, faltou a empatia e o perdão. Entendo que aqueles que são de natureza endurecida, são os que mais precisam receber atitudes positivas. Aquele que dá o primeiro passo descobriu e optou pelo caminho da segurança. Certa vez afirmei em um dos meus textos que quando duas pessoas ruins se unem, elas se tornam péssimas porque uma incentiva a outra no caminho obscuro. Mas quando duas pessoas esclarecidas e de valores altruístas se encontram, elas conseguem ver o que poucos enxergam. Conseguem se respeitar, mais que isso, passam a considerar o contexto pelo qual houve tropeços e arranhões no passado. Todos nós passamos e os que não passaram ainda passarão por um momento na vida em que as nossas vulnerabilidades ficarão expressivas no nosso espelho. Diante delas nos endurecemos ou nos moldamos a uma nova estrutura. Afirmo que uma mulher sábia tem frieza de julgamento, quer dizer, ela não se emociona, ela vai na razão. Então, ela consegue pensar. A força de entendimento, ela chega a um pensamento, ela procura a sabedoria e, na hora de julgar, ela consegue ter a frieza para tomar a decisão correta. Isso a qualifica para ser conselheira. A razão deve nortear as decisões, pois os sentimentos costumam trair. Quando você tem a razão como domínio próprio, consequentemente você passa a ter um coração acessível e melhor. Reitero, quando jovens somos revestidos por sentimentos nada nobres.  Mas afinal, o que é nobreza? Nobreza é não precisar mais da aceitação do outro e ainda assim respeitar sua peculiaridade, movidos pela empatia. Nobreza  é construir um legado, se enriquecer de cultura e depender totalmente de Deus, e ainda assim fazer dos seus desafetos os afetos revestidos de consideração e respeito. Nobreza é caminhar mais uma légua pelo outro e entender que se você não amá-lo como Cristo ordenou, você se torna um candidato apto a não encontra-lo. Nobreza mesmo é não dependendo de nada, estando numa condição e situação favorável, reconhecer a importância do outro pelo viés de um novo contexto da sua história. Você não é obrigado a ser amigo de ninguém, mas muito menos inimigo. As pessoas mudam, a legislação avança, mas nada que elas fizerem fará sentido se você não se dobrar diante dos erros e se erguer diante do futuro. Sua reação diz sempre sobre você e não sobre o outro. É tempo de confraternização, é tempo de revermos o que devemos deixar no calendário que logo se tornará passado e avançarmos com prudência rumo a um futuro que pode e deve ser glorioso e de muita paz. 



Por Flavia Moreira. Advogada, pós-graduada em Direito Público, Direito Processual Civil, pelo IDDE em parceria com Universidade Coimbra de Portugal, ‘IUS GENTIUM CONIMBRIGAE, especialista em Direito de Família e Sucessões, associada ao IBDFAM e membro do Direito de Família da OAB/MG.

 

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