Os direitos da personalidade e a autonomia da vontade

 

Flávia Moreira

“A autonomia da vontade", segundo Pontes de Miranda, é um espaço em branco que a ordem jurídica deixa para a pessoa preencher como quiser. Já o autor francês do século XIX, Lacordaire, dizia que entre o forte e o fraco é a liberdade que escraviza e a lei que liberta.”

O que as duas importantes considerações de autores diferentes têm a ver com o tema que ficamos de abordar essa semana? Lembremos que na semana passada falamos um pouco da família monarca e da história que criou o enredo para a situação em que o príncipe Harry se colocou, onde determinou sua exclusão da foto oficial no seio familiar, levantando rumores, lamentos em todo o mundo, na coroação do seu pai, príncipe Charles.  Para essa situação faço valer as afirmações de Pontes de Miranda, mas questiono: “O que é o direito da personalidade? “Qual limite existente entre o direito do ser humano e a disponibilidade desses direitos?” São, na verdade, os direitos essenciais à dignidade, à honra e à proteção. São intransmissíveis, personalíssimos e inegociáveis. Porque questionei se, pela ótica da legislação brasileira, Harry estaria sofrendo violação quando exposto aos olhos do mundo de maneira arbitrária pelos monarcas? A verdade é que provavelmente a dor gerada em Harry pode ter sido por ele calculada e mensurada em razão das consequências das escolhas feitas por ele e guarnecido pelo próprio direito da personalidade de Harry em se posicionar de acordo com as novas diretrizes que optou tomar com a própria vida, se desligando automaticamente das solenidades dos monarcas. Podemos afirmar que Harry exerceu os direitos inerentes a ele quando renunciou ao seu posto. 

Caro leitor, ainda que eu acredite que uma pessoa sem referência, ou quando a perde fica sem rumo e deliberadamente, pode sofrer violação de seus direitos e indiretamente se coloca em situações que violarão sua intimidade, asseguro que não necessariamente infringirão seus direitos personalíssimos. Para Sílvio de Salvo Venosa, a personalidade não é exatamente um direito; é um conceito básico sobre o qual se apoiam os direitos e constituem o mínimo necessário da substância da própria personalidade.   

Paralelo a isso, quero fazer um pequeno resumo de uma simples constatação para fácil dedução analógica.

Certa vez eu parei diante da reforma que eu dava em minha casa e me dei conta de que o que era mais importante naquele imóvel ficava escondido, a exemplo: ferragens, elétrica, etc. Já o acabamento que eu escolhia para ser inserido na decoração do ambiente era para gerar conforto e impressionar a mim e a terceiros, mas o que tinha no interior da obra é o que realmente sustentava aquela casa. Bingo! Me dei conta de que o que está dentro de nós é que realmente possui valor, portanto, o externo deve ser cuidado, mas o abrigo da nossa alma (nosso corpo) não diz quem realmente somos. 

O direito da personalidade está justamente anelado a beleza de não infringirmos os nossos valores, e quem de fato somos. Portanto, a meu ver, Harry exerceu seus direitos e se posicionou frente ao que realmente lhe importava e exalava em sua alma. Quanto aos rumores e lamentos? Eles são parte da plateia que para mensurar o ocorrido se pautam em seus próprios sentimentos, condolências ou críticas. 

Flavia Moreira é advogada, pós-graduada em Direito Público, Direito Processual Civil, pelo IDDE em parceria com Universidade Coimbra de Portugal, ‘IUS GENTIUM CONIMBRIGAE, especialista em Direito de Família e Sucessões, associada ao IBDFAM e membro do Direito de família da OAB/MG.

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