O país da acepção de pessoas

Raimundo Bechelaine - O país da acepção de pessoas

Setembro é um mês privilegiado. No calendário histórico e cívico do Brasil, é o mês da (suposta) independência nacional. No calendário da natureza, é o mês da entrada da primavera, das chuvas e dos ipezeiros floridos.  No calendário pastoral da Igreja, é o mês da Bíblia Sagrada; mas também do Grito dos Excluídos. 

A propósito, nos últimos domingos, a segunda leitura bíblica da missa vem sendo tirada da epístola do apóstolo Tiago. Domingo passado, o apóstolo falava-nos (2, 1-5) sobre o fazer ou não acepção e discriminação entre ricos e pobres, nas assembleias litúrgicas. O texto bíblico fala literalmente sobre isso. 

Façamos uma confrontação entre o 7 de setembro e a Sagrada Palavra.  A maioria do povo brasileiro se proclama cristã. Consideremos então que o Brasil é, como todo país, uma enorme assembleia. Cada país possui uma população organizada em sociedade, formando uma grande assembleia política/cívica. Canta-se o mesmo hino, reverencia-se a mesma bandeira, vive-se sob as mesmas leis, fala-se a mesma língua, cultivam-se religiões, costumes e tradições iguais ou semelhantes. Ou seja, nesta imensa assembleia estão presentes e atuam elementos históricos, étnicos, econômicos e culturais.

Tomemos a exortação de Tiago e examinemos a nossa "assembleia". Ou seja, passemos a sociedade brasileira pelo filtro bíblico de Tiago 2, 1-5. O texto não se perde em teorias abstratas. É concreto, fácil de entender. Pergunta sobre os lugares, os espaços que a assembleia estaria destinando ao rico e ao pobre. Ao primeiro concede-se lugar de honra, conforto e destaque. Ao segundo se diz que procure um lugar qualquer, talvez até que se acomode no chão. 

Qual é, na sociedade brasileira, o tratamento dispensado aos ricos e aos pobres? À chamada classe A e às classes operárias C e D? Para quem se constroem os bairros bem urbanizados, os edifícios e condomínios de luxo ? Quem vai morar nas favelas, nas encostas dos morros ou debaixo das pontes e nas ruas? Quem está nas filas intermináveis em busca de emprego, de uma cesta básica ou até de um osso para dar gosto à sopa? A qual público destinam-se as escolas públicas sucateadas e os belos e bem equipados colégios particulares?

As perguntas podem multiplicar-se e estender-se. São focais e elementares. As respostas revelam, com toda evidência, que vigoram na sociedade brasileira os "critérios injustos" de que falam Tiago e a Bíblia. Pátria, hinos, cores nacionais, religião, moral e outros apelos são engodos que mal dissimulam a realidade. Afinal, somos o país e a sociedade da discriminação e da exclusão. Somos uma assembleia que faz, confirma e mantém a acepção de pessoas.    [email protected]

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