O MINOTAURO DE CADA UM
CREPÚSCULO DA LEI – Ano V – CCLII

Domingos Sávio Calixto
Para que serve um mito?
Para dar segurança.
A insignificância humana – diante do cosmos, da natureza – impõe à criatura o vazio e a escuridão como derradeiros vales sombrios nos quais o espírito do medo será único, claudicante e tormentoso companheiro.
“In itinere”, a criação dos mitos tranquiliza o homem, dando-lhe frágil e mínima sensação – mágica - do seu poder insignificante.
Na herança grega, por exemplo, não há como deixar de se extrair algum conforto ou resignação nos mitos de Édipo, de Pandora, da Medusa, de Medéia, da Odisseia, de Perséfone, de Midas ou de Orestes.
E o Minotauro?
Minotauro é o “Touro de Minos”.
Filho de um touro pelo qual Pasífae se apaixonou plena e bestialmente, daí condenado a ser preso no labirinto de Dédalo, no subsolo do palácio de Cnossos, ilha de Creta.
Uma figura grotesca, assustadora, cabeça e cauda de touro em corpo de homem
O encarceramento do Minotauro se deu pela traição ao deus Poseidon, o qual teria auxiliado Minos a derrotar a deusa Atenas – deusa das artes e da sabedoria – pelo trono de Creta.
Poseidon queria a besta sacrificada, bem como Atenas igualmente queria sua vingança, daí restou ao Minotauro descer ao seu próprio inferno perpétuo, o labirinto.
Como espetáculo cruel, de ano em ano, eram enviados 7 mulheres e 7 homens para lá, onde iam para matar ou morrer. Foi em um destes envios de “oferendas” que estava o famoso Teseu. Foi ele quem, como sabido, matou o Minotauro.
Qual o mito do Minotauro?
Ora, ele pode ser compreendido como um miniaturo do diferente, do desigual, daquele que não é normal. Ele representa toda a arte, não só a arte “convencional”.
O Minotauro é a arte plena que devora a juventude, mas que também pode ser morta por ela.
Trata-se de uma arte considerada maldita que a sociedade insiste em manter na clausura de seus labirintos, do seu inconsciente coletivo.
O labirinto é a ordem coletiva na qual “o diferente” deve ser sacrificado, deve ser eliminado. Teseu é a conservação da ordem, a impulso destruidor do novo, do extermínio moral que o consciente impõe como castração.
Por conseguinte, o touro representa a não castração.
Personifica todas as formas de amor e arte na sua plenitude. É o prazer em inteireza.
Além disso, traz também a personificação da força de Áries unida à beleza e ao esplendor.
Em se rendendo à extensão do mito, eis aí um labirinto em todos, e com rituais de sacrifícios constantes.
Talvez a morte do Minotauro seja, tristemente, o trancamento da arte plena e do prazer libertador, bem como a renovação da condenação à dor e à clausura dos limites impostos a cada um.