Moradores em situação de rua descartam lixo na beira do rio

Embalagens, cobertores e outros materiais também são depositados; Prefeitura e voluntários tentam resolver situação

Bruno Bueno

A entrega de marmitas solidárias para pessoas em situação de rua é, desde sempre, uma tradição em Divinópolis. Voluntários de todas as idades se reúnem para promover solidariedade e garantir o alimento a pessoas em situação vulnerável. Um dos locais mais procurados por essas pessoas é a praça Candidés.

Contudo, o acúmulo e descarte incorreto do lixo tem atrapalhado a ação social. Na praça, por exemplo, é possível notar a grande concentração de lixo e entulho. Embalagens, cobertores, roupas doadas e outros materiais são descartados às margens do rio Itapecerica. A reportagem conversou ontem com representantes do poder público e da sociedade civil que estão tentando resolver o problema.

 

Prefeitura

A Prefeitura, por meio da  assessoria de comunicação, detalhou sobre a periodicidade das limpezas feitas no local.

— Geralmente a limpeza é quinzenal ou semanal, mas, dependendo da situação, pode ser de acordo com a demanda. Na praça Candidés, a limpeza está programada para amanhã — afirma. 

O Executivo também citou as instituições voluntárias.

— Será feita orientação para as instituições que prestam esse tipo de ação a moradores de rua da cidade — pontua.

 

Coletivo

A estudante de publicidade Nathália Valente é voluntária no Coletivo Rango. A entidade produz marmitas solidárias para pessoas em situação de rua e realiza as entregas todos os sábados. A praça Candidés é um dos locais atendidos. Questionada sobre o acúmulo de lixo, ela detalhou o que vem sendo feito para resolver o problema.

— Uma das ações que o coletivo faz para conscientizar essa situação é escrever nas tampas a frase “lixo no lixo”. Todas estão escritas assim. Já é uma preocupação nossa desde o início do projeto. No entanto, acaba que não temos muito controle e não dá para gente ir lá e recolher tudo, mas a gente sempre fala com eles também — ressalta.

A entidade não leva sacolas de lixo para descarte dos materiais. Nathália explica os motivos.

— Porque, muitas das vezes, eles não comem na hora. Muitos moradores não foram ensinados a compartilhar o alimento e sentem vergonha de comer acompanhados. A situação de rua já traz vergonha. Tem gente que não tem nem dente para comer — disse.

 

Lixo

De acordo com a estudante, a ausência de mão de obra e a dificuldade logística também atrapalham a coleta do lixo.

— Como não temos esse controle, é difícil de recolher. Além disso, não somos muitos. Normalmente quatro em um carro, junto com as ecobags e mochilas de entregadores, cobertores, água e outros. É complicado fazer essa logística. Torcemos para que exista alguma política pública para recolher os entulhos. Isso é mais responsabilidade do poder público do que da sociedade civil — acrescenta.

Para ela, o problema não é só da entidade voluntária. A falta de noção de alguns populares e a ausência de políticas públicas  também possibilitam a prática.

— O lixo é um problema de todos. Da sociedade civil na forma de entendimento sobre a necessidade de separação do entulho. Muitos enxergam apenas como descarte, não pensam no depois. Além disso, o poder público deve promover políticas públicas de sustentabilidade e reciclagem dentro da cidade, como maior distribuição de lixeiras — acrescenta.

 

Trabalho

O trabalho realizado pelo Coletivo Rango atende, em média, cerca de 70 a 80 pessoas. Além de comida, os voluntários também levam água, sobremesa e, em épocas sazonais, cobertores. 

— O trabalho começa na sexta-feira anterior com a organização da comida, separação de materiais, recolhimento de “recicles” (alimentos próprios para consumo, mas impróprios para venda) dos verdurões. Além das pessoas em situação de vulnerabilidade, entregamos alimentos na UPA para pacientes com crianças. A entrega acontece quando as marmitas sobram — explica.

Emocionada, Nathália aproveitou a oportunidade para detalhar o nascimento do coletivo que busca oferecer alimentação de verdade para quem mais precisa.

— O Rango começou na Uemg em 2018 com três pessoas. O intuito era promover alimentação para inseridos na faculdade. Veio a pandemia e a Fátima, nossa madre gestora, foi contemplada com um edital da Lei Aldir Blanc em que era necessário produzir vídeos divulgando a comida mineira. Ela estava com alimentos sobrando e decidiu levar para pessoas em vulnerabilidade — salienta.

 

Começo

A voluntária conta que, no começo, apenas 30 marmitas eram produzidas. A partir do empenho de novos voluntários, o trabalho foi crescendo. O diferencial do coletivo, segundo Nathália, é a presença impreterível de carne. 

 

— Os moradores mesmo dizem que nossa comida é de verdade. Na semana toda, eles comem sopa. No sábado, comem arroz, feijão, carne e verdura — detalha.

Mesmo com a importância da ação, a estudante alerta que o trabalho feito pelo coletivo não deve ser romantizado.  

— A Fátima, por exemplo, cede a casa dela para fazer a comida. O Rango invade o espaço dela. Apesar disso, é um trabalho gratificante. Um dos nossos maiores sonhos é transformar o Rango numa associação. Já estamos no processo de transição de coletivo — finaliza.

 

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