Mineiridade cordial

Rotativa - Mineiridade cordial

“A princípio” e “em princípio”, o título do livro “Estação das Esperas”, da Sulamita Coelho Amaral, desperta curiosidade já no título: enquanto o termo “A princípio” significa inicialmente, “em princípio” vem a ser “em tese”. Daí que...

Na verdade, a distinção entre tais expressões não passa de firulas dispensando preciosismos literários complicadores. Na verdade, o nome do livro, “Estação das Esperas”, já é poético. Vejamos o que vem lá. 

Mais precioso que tudo, o nome do livro da Sulamita Coelho Amaral com a menininha brincando com folhas soltas, ao compasso do teclado do piano curtido por um apreciador sentado ao lado, apreciando o quadro que enfeitiçou a romântica autora. É essa apenas uma leitura da bela capa do livro “Estação das Esperas”, da nossa Sulamita. E o que se vê do livro beira um susto, devido ao insólito do quadro e à linguagem dos textos, de uma mineiridade comovente. 

 A linguagem mineira é autêntica e comovente. A religiosidade, no belo texto de Sulamita, ocupa espaço comovente na nossa realidade. Medo de chuva, medo do demônio, medo do mal-assombrado. Salve-rainha, mãe de Misericórdia, Creio em Deus Pai... Mas bruxaria e feitiço, resistir quem há de? Ainda bem que a Sulamita consola jurando que a revoada de anjos esconjura toda e qualquer maldade... 

 Mina Geral pitoresca, resistir quem tenta? É… Mas, por exemplo, acontecem coisas muito esquisitas... Contam que aquele respeitável senhor que não perdia a reza do terço andava às voltas com a andropausa, que judiava… Contam nas rodas da tardinha que, atrás de remédio, o pobre homem corria de benzedeira e farmácia procurando remédio e nada dava certo… Nem experiência nem boa vontade. É… Sexo de homem quando zanga é mesmo complicado… Até que, de muito pelejar de farmácia em terreiro viu, de pura sorte, na loja da esquina, um conjunto de bonecas as mais louçãs e bonitinhas. Não titubeou: — Moço, embrulha pra mim aquela boneca ali, a mais bonita, de roupinha de crepom vermelho e peitinho de fora...

 Que remédio milagroso! Claro que ele sarou... 

Êh, Mina Geral! Tem raiz e folha e receita para tudo em Minas. Só tristeza que não tem jeito… No mais, sabugueiro e chá de pétala de rosa costuma resolver. No mais, é tudo mina geral...

E paixão e raiz pra quebranto e mau olhado. O resto é só pegar com Deus, ou dormir de mão dada com a mãe que dá certo...

No mais, é mina geral: primeiro a oração, depois obrigação e a devoção...

No mais, é mina geral, é religiosidade, é amizade, é saudade...

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Ê, Minas ! Êh, Sulamita Coelho Amaral, sensibilidade à flor da pele, alegria contagiante. É a mineiridade aflorada.

É o acolhimento aos idosos, ajuda aos necessitados, hino eterno à liberdade.

E o humor que a autora preserva com tanto talento e respeito! É a mineiridade “destrambelhada”!

A autora entra com coragem e competência no universo mineiro das traições amorosas, das traições assumidas, do amor não correspondido que acaba em tragédia...

Ê, Minas, traição e perdão, novela que faz a gente chorar… E mais traição e mais perdão.

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No mais, é entrar na tradicional Minas Gerais e apreciar a paisagem pitoresca nela apontada pela Sulamita Coelho Amaral. 

E não se assuste. Vai ver uma montanha de traições e traições e pecados e vinganças, e traições e mais traições e vingança e perdões e sexo roubado e alegria e traição e perdão e recaídas, mais traições em meio a recaídas… Afinal, é ver a vida como ela é cheia de altos e baixos e arrependimentos e recaídas, pecadilhos perdoados, enfim, é pousar os pés neste mundico enquanto a alma passeia entre estrelas… Afinal, de gente humana, suas fraquezas e limitações e grandezas, a Sulamita entende. 

>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>>: Sulamita, quem sabe, a obra ficaria mais leve e palatável com a diminuição de personagens e com nomes próprios menos familiares? 

No mais, admiração pelo talento e coragem de salto tão significante! Que seu talento e alegria contagiante não se percam em meio à mineiridade aqui reinante!



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