Faça o que eu falo

Faça o que eu falo 

Existe um fundamento no marketing político que se chama “a jornada do herói”. Essa estratégia é utilizada para causar empatia, comoção e criar vínculo entre candidato e eleitor. Aqui, no Brasil, os eleitores procuram, a cada dois anos, heróis que vão mudar a realidade do país e, consequentemente, a sua realidade. Diante da situação do povo brasileiro, essa procura não está totalmente errada, afinal, quem não gostaria de eleger um super-herói que mudasse, do dia para a noite, esta triste realidade enfrentada pelo povo? Quem não gostaria de acordar um dia e ter infraestrutura em seu bairro, transporte público digno, emprego e renda que colocasse muito além do básico em casa, um sistema de saúde público eficaz, acesso à educação, uma nação livre da corrupção, da violência? Quem não gostaria? Mas a grande verdade é que tal comportamento só nos afasta de um dia podermos sonhar com pessoas competentes no poder, pois essa busca pelo herói nos tira a capacidade de raciocinar, de enxergar os candidatos como eles realmente são e de, assim, eleger pessoas capazes de legislar e de executar dentro do que o povo necessita. 

A jornada do herói funciona basicamente assim: o candidato cria uma narrativa de que ele veio do povo, é do povo e sabe do que o povo precisa, e que ele só conseguiu chegar onde chegou com muita luta, esforço e dedicação. Depois de desenvolver essa ilusão, o passo seguinte do plano é mostrar com fotos e vídeos que é uma pessoa humilde, de bom coração, se importa com o próximo e ajuda o próximo, e está envolvido em várias ações de caridade. Talvez, se a população não estivesse tão envolvida em sua busca pelo herói, já teria entendido esta situação e mudado um pouco o seu pensamento. Uma das práticas mais usadas pelos políticos – até mesmo antes do surgimento das redes sociais – é expor aqueles mais necessitados, é mostrar que eles se importam com aqueles que estão em situação de vulnerabilidade social. 

Hoje, com o boom da internet e das redes sociais, essas ações apenas ganharam mais visibilidade e mais impacto. O intuito deste tipo de comportamento nada mais é do que gerar empatia nos eleitores e criar vínculos. Porém há de se fazer um questionamento com isso: quem ganha ao expor uma pessoa em situação de vulnerabilidade social? O cidadão que está ganhando uma cesta básica, a criança que está sendo levada para tomar um lanche, ou o político que publicou aquilo em suas redes sociais? 

O que mais chama a atenção nisso tudo é que os mesmos que pregam ser cristãos, que pregam pertencer e defender a família tradicional brasileira são os que vão contra ao que está em Mateus, 6: 2,3: “Quando, pois, deres esmola, não faças tocar trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Mas, quando tu deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita”. Em outras palavras, é apenas aquele velho ditado: faça o que eu falo, mas não faça o que eu faço! E viva o marketing político.

 

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