CPI da Educação avança e secretária é afastada

Decisão é temporária e foi divulgada no início da noite de ontem; notas apontam para materiais pagos, mas que não chegaram

 

Matheus Augusto

A secretária de Educação de Divinópolis, Andreia Dimas, está temporariamente fora do cargo. A Prefeitura divulgou a decisão no início da noite de ontem. Segundo o comunicado, o afastamento foi determinado em razão da tramitação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga os gastos realizados pela pasta no fim do ano passado. Conforme o decreto, uma transição será iniciada nos próximos cinco dias.

— Estou tranquila sobre a investigação, pois tenho a consciência tranquila do que cabe à Semed — afirmou ao Agora a secretária sobre a decisão.

 

Casos

Os questionamentos sobre os valores gastos e os produtos comprados pela Secretaria de Educação (Semed) de Divinópolis no fim do ano passado continuam. Desta vez, em entrevista ao Agora, o presidente da Câmara, Eduardo Print Jr. (PSDB), detalhou os relatos recebidos após sua visita a escolas municipais. Em uma das mais recentes está a aquisição de três mil carteiras escolares. Segundo ele, o processo, para além do alto valor pago, levanta questionamentos. 

—  Para fazer a aquisição de três mil carteiras escolares você teria um preço acessível em qualquer edital de licitação (...). O que me estranha muito é terem aderido atas de regiões fora do Centro-Oeste — avalia.

Print ressalta que as carteiras foram compradas pelo valor unitário de R$ 593, enquanto em outras localidades há preços menores. 

—  (...) tem ata de cidades vizinhas, como Pará de Minas, que a mesma carteira custa em média R$ 220 — apontou.

O parlamentar relembrou que, no início de 2021, o governo federal enviou R$ 102 mil para a compra de 380 carteiras escolares pelo valor de R$ 200. Ele reconheceu a influência da pandemia e da inflação no aumento do preço, mas defendeu ofertas mais baixas.

— Quando se tem um poder de compra agregado, de grande quantidade, você consegue ter negociação de preços com os fornecedores, sim — pontuou.

 

Adesão

Um dos principais questionamentos referentes às compras é o modelo adotado, o de adesão das atas de outros municípios/consórcios. Print também faz coro ao movimento. 

— Por quê? Quem trouxe as atas para Divinópolis? Como elas chegaram aqui? Quem veio aqui e apresentou atas que atendiam às demandas da cidade? — questiona. 

De acordo com o vereador, o processo é “complexo e perigoso”, pois é necessária a adesão de, no mínimo, acima de 70% dos itens constantes na ata. Caso contrário, é invalidada. 

 

Produtos na mira

As denúncias ganharam forma, inicialmente, com o brinquedo play balls quádruplo, adquirido pelo valor de quase R$ 10 mil cada. Desde então, outros produtos levantaram dúvidas e suspeitas, como laboratórios de matemática por aproximadamente R$ 50 mil, e de ciência, por cerca de R$ 80 mil cada, relata Print. Além do alto valor investido, alguns se encontram sem uso. 

— Os laboratórios de ciência estão nas escolas e não tem lugar para colocar ou sala para instalar, estão sem utilização — afirmou.

Outro agravante, segundo relatos recebido pelo vereador, é a ausência de um dos itens, o esqueleto humano, também previsto para ser utilizado nos estudos. 

— Existem também os notebooks. (...) Cada escola recebeu no mínimo dez e eles estão sem utilização porque é proibido salvar algo dentro deles, assim me reportado. (...) Não justifica. Tudo isso está parado nas escolas municipais — relatou. 

A situação também é alvo de questionamento do vereador.

— Por que as escolas não estão utilizando os materiais? Se comprou, tem que ter espaço para colocar. (...) Se não cabe, vai comprar por quê? E comprou 16 kits de ciência ao valor de R$ 80 mil cada sem se preocupar onde ia colocar — questionou. 

Ainda segundo Print, está em curso a apuração se todos os itens foram devidamente entregues. 

— Existe uma lista de conferência e alguns produtos não chegaram e, no Portal da Transparência, as notas fiscais já estão quitadas — frisa.

Uma lista à qual a reportagem teve acesso mostra a compra de 36 itens (com quantidades diversas cada). Desse total, apenas 20 foram entregues. 

Os materiais variam desde rede de futsal até notebook. 

Para Print Jr., as evidências apontam para a desorganização na condução do processo. 

— Comprou, pagou e não entregou. Cada hora que passa e recebemos denúncia ficamos mais surpresos com a desorganização com a empregabilidade desse recurso — cita.

Para o vereador, com o recurso utilizado, diversas melhorias poderiam ter sido aplicadas nas escolas.

— Tem aluno brincando no sol, na chuva; local de merenda e cozinha minúsculos; sala de reforço do lado externo. E, poxa, tem quatro brinquedos de R$ 10 mil cada. Poderia cobrir, fazer uma grande cobertura para dar condições às crianças de estudar, brincar, fazer o estudo de reforço. (...) Me deixa triste — comparou. 

O presidente da Câmara também justificou que expõe as denúncias, pois é “um vereador e apura denúncias como qualquer outro”.

— Infelizmente, essas últimas denúncias apresentadas na Câmara são escandalosas. Talvez, possam se tornar uma CPI histórica com a maior descoberta de uma ata superfaturada na história da cidade.

 

Vice-prefeita se manifesta

A vice-prefeita, Janete Aparecida (PSC), que até então não havia se manifestado, divulgou, em suas redes sociais, na noite desta terça-feira, uma nota de esclarecimento sobre o andamento da CPI da Educação. Janete reconheceu o processo como “legítimo, legal e transparente”. 

— Não cabe a mim fazer juízo de valor, e sim abrir as portas da Prefeitura para Câmara ou qualquer outro órgão fiscalizador legítimo — afirmou.

A vice-prefeita se colocou à disposição da comissão para prestar os devidos esclarecimentos, inclusive com a disponibilização voluntária de informações sobre sua conta bancária e telefônica, “pois prezo pela total transparência em toda a minha vida pública”, garantiu.

— [Aguardo] a data e horário de convocação da CPI para prestar os esclarecimentos que forem solicitados. Como secretária de Governo, sou responsável pelo cumprimento do plano de Governo e dos alinhamentos com secretários de todas as pastas, inclusive a Educação — encerrou.

 

CPI

A investigação tem Josafá (Cidadania) na presidência e Lohanna França (PV) como relatora. Rodrigo Kaboja (PSD), Ademir Silva (MDB) e Ana Paula do Quintino (PSC) atuam como membros. 

A abertura da CPI foi solicitada por Ademir Silva para investigar seis processos de adesão a atas de registros por suspeita de “vícios de legalidade ou sobrepreço”. Há suspeita da compra de produtos com valores acima do mercado para se adequar ao percentual mínimo de investimento na Educação. 

A Prefeitura nega as acusações, porém, abriu uma sindicância interna para investigar "possível vício em processo administrativo licitatório para adesão à ata de registro de preços” na secretaria.

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