Como escolher candidatos em 2022? (parte 2)

CRÔNICAS DEMOCRÁTICAS

Márcio Almeida

Como escolher candidatos em 2022? (parte 2)

Na segunda parte de um texto com sugestões a jovens eleitores e demais pessoas quanto a critérios de escolha de candidatos a deputado, o colunista trata da avaliação dos novatos na política

 

Na semana passada, como parte desta série de crônicas sobre as eleições de 2022, apresentei algumas sugestões de critérios que o eleitor e a eleitora podem empregar na escolha de seus candidatos a deputado estadual e federal. Tratei na ocasião de parâmetros para avaliar candidatos que já exerceram mandato na Assembleia Legislativa ou na Câmara Federal. Dando continuidade ao tema, sugiro agora alguns critérios que podem ser usados para avaliar os novatos. Caso o candidato não tenha ainda exercido mandato em casa legislativa estadual ou federal, sua avaliação pelo eleitor torna-se, obviamente, uma operação menos precisa do que a de atuais ou ex-mandatários. Nem por isso, porém, o voto deve ser um cheque em branco a depender da sorte. A experiência histórica ensina que podem ser levados em conta alguns parâmetros: a consistência ideológica do candidato e seu espírito público, assim como a sua viabilidade eleitoral. Tratei na semana passada dos dois primeiros, comuns aos candidatos que já têm experiência legislativa estadual ou federal. Trato agora do terceiro, a viabilidade política. Esta, somada aos demais critérios, tem caráter decisivo para ajudar o eleitor a escolher de modo criterioso os nomes aos quais vai dar seu voto.

Por força da legislação que regulamenta o sistema de representação proporcional, a viabilidade eleitoral de um candidato a deputado é o resultado de uma equação que leva em conta tanto o seu próprio desempenho quanto a conjuntura partidária em que ele se encontra. Nesta conjuntura são decisivos, entre outros fatores, o número de candidatos ao mesmo cargo e seu potencial de voto, bem como a existência ou não de uma federação de partidos, que pode influenciar diretamente nas perspectivas de se atingir o quociente partidário, número mínimo de votos que cada sigla ou cada grupo de siglas precisa obter para eleger um parlamentar. Embora tais fatores tornem difícil prever o resultado de eleições para deputado, havendo pequenas votações que elegem e grandes votações que não o fazem, certos critérios permitem ao eleitor decidir sobre a viabilidade de uma candidatura e, o que é mais importante, distingui-la de uma aventura inspirada apenas pela vaidade do candidato. Um desses critérios é o lastro político, que entendo aqui como o nível de inserção de um candidato em um ou mais segmentos sociais, assim como o reconhecimento e o respaldo que ele recebe dos eleitores nesse processo.

Não se pode negar, em uma perspectiva realista, que o poder econômico, além de comprar votos, ainda é capaz de fabricar a ilusão midiática de lastro político. Isso, porém, vem se tornando cada vez mais difícil em tempos de redes sociais, cuja utilização intensiva na política diminuiu, quando não extinguiu, o impacto da propaganda eleitoral tradicional. Por outras palavras: redes sociais, ao contrário da propaganda eleitoral veiculada em canais de rádio e TV e da cobertura jornalística tendenciosa que fazem alguns veículos, não criam “climas” capazes de esconder a falta de lastro político e ainda julgam duramente, no tribunal do cancelamento, aqueles que tentam criar uma imagem de si mesmos não condizente com a realidade.

Se o lastro político não pode ser fabricado com procedimentos midiáticos, a questão que se coloca é sobre como o eleitor pode identificá-lo e, assim, distinguir políticos autênticos de aventureiros eleitorais. A experiência mostra que são vários os modos de um candidato construir seu lastro político. Fundamental, qualquer que seja a maneira por ele escolhida, é considerar que candidaturas a deputado, com exceção das que ocorrem em metrópoles com grande colégio eleitoral, são projetos essencialmente regionais. Como indicam os números de eleições anteriores, nem sempre o candidato obtém uma votação expressiva em seu município de origem, até porque o critério geográfico é apenas um dos que são levados em conta pelo eleitorado. O eleitor também vota com seu gênero, sua orientação sexual, sua etnia, sua categoria profissional e sua religião, sem esquecer que também vota com laços de parentesco e amizade, sentimento de gratidão, entusiasmo momentâneo ou até mesmo com a lamentável oferta de vantagens pessoais que por ventura lhe seja feita. É essa pluralidade de razões que explica o fato de muitas dezenas de nomes terem voto em um mesmo município, o que dificulta a eleição do chamado candidato da terra. Isso equivale a dizer que o lastro político precisa quase sempre ser buscado em outros municípios, a não ser em casos raros relacionados aos grandes colégios eleitorais ou a situações específicas de quociente partidário em que um candidato pouco votado elege-se beneficiado pelas “sobras” da grande votação obtida por outro. Essa busca de votos, ao alargar o horizonte geográfico da campanha, amplia as possibilidades de eleição mesmo em circunstâncias nas quais a cidade de origem do candidato demonstra baixa adesão a seu nome. É o que fazem, via de regra, os deputados mais experientes.

No caso dos novatos, são múltiplas as possibilidades de o eleitor identificar o lastro político. Pode-se afirmar, contudo, que há algumas mais frequentes, já mapeadas pela experiência de pleitos anteriores. Entre estas possibilidades, que integram a lógica da representação democrática, está a de o candidato estratificar seu pedido de votos a partir do diálogo com grupos de interesse específicos. Dependendo da coesão interna destes grupos e de seu potencial de organização e mobilização, assim como da disponibilidade de recursos logísticos para campanhas cada vez mais dispendiosas, algumas candidaturas podem sair do âmbito regional e transformar-se em um movimento de caráter estadual. Tal fato tem se verificado, por exemplo, com alguns candidatos que representam o empresariado, o sindicalismo, certas categorias profissionais, o funcionalismo público, igrejas e grupos religiosos, entre outros.

Em alguns casos, por força de um discurso bem calibrado para o momento político, estes candidatos conseguem transformar seu pleito em uma causa que transcende os regionalismos e, por conseguinte, se tornam mais competitivos na disputa eleitoral. O mesmo vem ocorrendo, em medida crescente, com alguns candidatos provenientes dos movimentos de defesa e empoderamento de mulheres, pretos e pardos, deficientes e membros do segmento LGBTQIA+, entre outros do espectro identitário, atualmente em alta. No grupo dos candidatos que transcendem  sua região estão os chamados influenciadores. Estes, entretanto, merecem uma crônica à parte.

 

Márcio Almeida é professor, jornalista e analista político

 

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