Comissão de Saúde da Câmara fiscaliza a UPA: ‘Desumano’

Vereadores receberam denúncias de que a média de espera por atendimento pode chegar a até 7 horas

Matheus Augusto

Uma criança, com quadro grave de apendicite, há mais de 48 horas à espera de uma cirurgia. Esse foi o cenário encontrado pela Comissão de Saúde da Câmara em visita à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Divinópolis - atualmente administrada pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBDS) até a definição da nova gestora. Durante a reunião do Legislativo de ontem, os vereadores que integram a comissão e outros voltaram a criticar a lotação na unidade. Os membros foram até o local para atender a um “pedido de socorro da equipe técnica da UPA”, definiu o presidente Zé Braz (PV) em seu pronunciamento. Lá, ele e os demais encontraram corredores ocupados por pacientes em macas e cadeiras. Até ontem, quando estiveram na unidade, 58 pacientes estavam à espera de uma transferência hospitalar.

— Encontramos uma situação muito preocupante. (...) Todos os corredores lotados — relatou Zé Braz. 

A comissão foi comunicada pela direção da unidade que “a média de espera para atendimento de cada paciente chega a cerca de sete horas, variando de acordo com o quadro clínico e a urgência demandada”.

 

Falta de leitos

O presidente da comissão detalhou ainda que, dos 58 pacientes na fila por internação, 17 são crianças - sendo que a sala de pediatria conta com apenas sete leitos de observação. Além disso, seis pacientes estão entubados em ventilação mecânica; um deles já aguarda por uma vaga há mais de 22 dias.

Outra preocupação dos vereadores é que três dos entubados testaram positivo para covid-19. 

— Com a desmobilização dos leitos para covid, o Hospital São João não tem mais referência para receber esses pacientes — justificou.

A prova da situação classificada como desumana pelos membros da comissão está na forma como os pacientes aguardam por uma transferência.

— A UPA está retendo até mesmo as macas do Samu para as pessoas aguardarem — destacou Ademir Silva (PSDB), que esteve na unidade ontem para visitar um parente e também ouviu pedidos  de socorro.

 

Novo que nasceu velho

O secretário da comissão de Saúde, Israel da Farmácia (PDT), pregou união entre os vereadores para reforçar as cobranças ao governador Romeu Zema (Novo) pelo reinício e conclusão do hospital regional. 

— Esta Casa tem que começar a brigar e se mobilizar (...) senão vai entrar na velha política de mais dez anos parados. Precisamos, urgentemente, resolver o problema da Saúde em Divinópolis e o primeiro passo é o término do hospital. (...) Na hora de vir aqui passear nas ruas e pedir votos, ele veio. Está na hora, Zema, de você vir aqui e cumprir com sua palavra e trazer dignidade para a população de Divinópolis — cobrou.

 

UPA não é hospital

Israel ressaltou que “90% de quem está na fila lá fora não deveria estar ali, teria que estar no posto de saúde”. Em complemento, o presidente da comissão, Zé Braz, lembrou que a UPA é uma unidade de atendimento transitório. Lohanna França (PV), que também integra a comissão, reforçou a fala dos colegas. 

— A UPA tem que ser um lugar de transferência em até 12 horas — destacou.  

 

Orçamento

Para Lohanna, o problema não é financeiro, mas de planejamento. Apesar da alta demanda, Israel da Farmácia reconheceu que o problema não está no corpo clínico - composto por nove médicos por plantão, cinco enfermeiros e 18 técnicos de enfermagem. 

— Em questão de corpo clínico, a UPA está bem servida, que até hospital particular em Divinópolis não tem — citou.

Já Lohanna acusou a Semusa de gastar “dinheiro do jeito que quer” após apresentar um Plano Municipal de Saúde às pressas e com trechos supostamente copiados do plano de Belo Horizonte, com erros iguais. A vereadora relatou que, na quarta, esteve na Prefeitura para uma reunião com o secretário de Saúde e demais representantes do setor. 

— Foi um terror. Até dizer que mais de 500 municípios mineiros não tinham o plano, o secretário disse — contou. 

A parlamentar cobrou melhor aplicação dos recursos, como a contratação de profissionais para a atenção primária e reformas nas unidades de saúde. Outro ponto de sua cobrança, após relatar a presença de uma criança com quadro grave de apendicite à espera na UPA por mais de 48 horas, foi o Hospital Regional. 

— A gente fica aqui, igual um sapo, na água fervendo. Ou a gente começa a pular ou seremos fervidos — concluiu.

 

Menos vídeo, mais solução

Ademir disse estar “envergonhado de ser Divinópolis”. 

— É muita gente, tanto de fora quanto de dentro. Gente esparramada nos corredores, amontoados; tinha gente que tinha chegado e aberto protocolo às 11h da manhã e eram 21h30 e ainda estava sem atendimento. Isso não pode acontecer. São divinopolitanos que pagam seus impostos — frisou.

O vereador relatou ter visto pacientes em camas sem colchão ou mesmo em macas emprestadas pelo Samu. 

— Estão brincando com a saúde de Divinópolis. Cadê o prefeito? Prefeito, não vá lá gravar vídeo, vá lá resolver — citou. 

Ademir explicou, ainda, a sobrecarga de trabalho dos enfermeiros, o que impede condições ideais de um atendimento de qualidade.

 

Formalização da denúncia

Diante da situação, o presidente da comissão, Zé Braz, acompanhado de Lohanna, foi até o Ministério Público (MP) na tarde de ontem para apresentar a denúncia da situação encontrada. 

Antes de ir ao MP, Braz reforçou, na Câmara, o pedido por “dignidade aos pacientes”. 

— É um caso muito sério. É injusto, desumano, você ver uma pessoa há dias sentada numa cadeira aguardando uma internação — justificou. 

Ele também não poupou críticas ao superintendente regional de Saúde de Divinópolis, Júlio Barata, o qual rotulou de inapto para o cargo: “cabide de emprego do Romeu Zema”, definiu. 

— Com certeza ele tem um excelente plano de saúde e não precisa ficar sentado numa cadeira da UPA esperando internação — apontou.

Braz também defendeu a compra leitos da rede privada para os pacientes em espera.

— Que compre o leito. Isso o regulador estadual pode fazer, não faz por falta de caráter.

No MP, os vereadores discutiram que, no âmbito municipal, as unidades de saúde sofrem com falta de profissionais e, em esfera estadual, não há disponibilidade de leitos para transferência hospitalar. Como uma ação anterior à apresentada já está sendo movida, ambas serão juntadas para dar prosseguimento às discussões de melhorias para a área.

 

Ambulatório

Uma solução paliativa para descomprimir a pressão sobre a UPA deve ser apresentada nos próximos dias. O secretário de Saúde, Alan Rodrigo, prometeu à comissão a instalação de um ambulatório para o atendimento exclusivo de pacientes com síndromes respiratórios e gripais. O local escolhido foi a Policlínica, que recebeu pacientes com casos leves quando parte do forro do teto da UPA caiu e o espaço foi parcialmente interditado.

— Desde que começamos a identificar aumento consistente da demanda por atendimento na UPA, estamos adotando as medidas administrativas para implantar o Ambulatório de Sintomas Gripais e Respiratórios, que deverá funcionar na Policlínica — confirmou a Prefeitura.

A atual Administração também informou que a Semusa já abriu processo para contratação de médicos em caráter permanente. 

— A Secretaria Municipal de Saúde também realizou um processo licitatório para contratar empresa especializada em ofertar serviços médicos para garantir a continuidade da assistência. No entanto, precisamos ser transparentes e informar que até mesmo o setor privado está sujeito ao mesmo cenário de escassez de profissionais médicos com interesse em vincular-se ao Sistema Único de Saúde — ressaltou.

 

Outras ações

O Executivo reafirmou estar ciente dos problemas enfrentados na UPA. Dentre as medidas para minimizar a busca por atendimento na unidade está o fortalecimento da atenção primária.

— A Secretaria Municipal de Saúde tem cuidado de reforçar a Atenção Primária e transformá-la na estratégia preferencial de atuação na prevenção de agravos e na promoção e recuperação da saúde da população. Até o presente momento implantamos o Programa Saúde na Hora em cinco unidades de saúde, estendendo o horário de atendimento dessas unidades até as 22h. Para o funcionamento do referido programa foram contratados 19 servidores — detalhou.

O intuito, acrescentou o Executivo, é, inclusive, ampliar o programa para outras unidades.

— Desde janeiro de 2021, a Secretaria Municipal de Saúde aumentou o número de profissionais com vistas a ampliar a capacidade instalada das nossas unidades assistenciais e a possibilitar a conversão do formato das unidades convencionais em unidades da Estratégia Saúde da Família. No referido período, foram incorporados à rede 275 (duzentos e setenta e cinco) novos profissionais — complementou.

 

Posicionamento

O Agora questionou a Superintendência Regional de Saúde sobre as críticas apresentadas pelos vereadores. No entanto, até o fechamento desta reportagem, por volta das 18h de ontem, não houve resposta. 

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