Coligação denuncia possível crime eleitoral de governador, senador, deputado e prefeito

Mencionados negam crime; empresa alega que apenas cedeu espaço

 

 

Matheus Augusto

Apesar de ser apenas a 12ª maior cidade de Minas Gerais, Divinópolis já é a 5ª com o maior número de investigações por assédio eleitoral abertas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). São 18 apurações em curso, dentre elas de cidades vizinhas, como o evento promovido pelo movimento “Brasil Acima de Tudo”, no último dia 19, nas dependências da empresa Líder, em Carmo do Cajuru, com o tema "Conscientização eleitoral”. A empresa nega conduta ilegal, mas assinou ontem um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) se comprometendo a uma série de adequações para evitar o constragimento dos funcionários. Por outro lado, dez partidos apresentaram denúncia-crime sobre o ocorrido e solicitam a instauração de um inquérito policial. 

Diálogo

O Ministério Público do Trabalho de Minas Gerais (MPT-MG) publicou ontem que a empresa Líder Indústria de Estofados assinou o Termo de Ajuste de Conduta (TAC) "assumindo obrigações de suspender a prática e de promover o direito ao voto livre e secreto". Segundo o comunicado, após a denúncia de assédio eleitoral, o proprietário da empresa foi investigado e convidado a regularizar, espontaneamente, sua conduta. 

— Dentre os compromissos assumidos, está o de dar visibilidade pública às obrigações assumidas até o dia 31/10, divulgando o comunicado nos quadros de avisos da empresa, inclusive, nas páginas da empresa na internet. Deverá, também, comprovar ao MPT-MG a entrega do comunicado aos seus empregados, mediante recibo — informou o órgão.

A empresa, acrescenta o MPT, deverá se abster de ameaçar, constranger ou orientar seus colaboradores a manifestar apoio, votar ou não votar nos candidatos indicados por ela própria.

A empresa deverá, também, abster-se de dar, oferecer ou prometer dinheiro, dádiva, festa, churrasco, folga, feriado, bonificação ou qualquer outra vantagem ou benefício aos trabalhadores para obter manifestação política ou o voto deles para determinado candidato, bem como abster-se de realizar manifestações políticas no ambiente de trabalho e fazer referência a candidatos em reuniões e por meio de trabalho, uniformes ou quaisquer outras vestimentas, cartazes, panfletos etc — complementa.

Os direitos trabalhistas e ao voto também são assegurados pelo Ministério.

— Além disso, a empresa se comprometeu, ainda, a não impedir, dificultar ou embaraçar os trabalhadores, no dia da eleição, de exercer o direito ao sufrágio, ou de exigir compensação de horas, ou qualquer outro tipo de compensação pela ausência decorrente da participação no processo eleitoral e de não discriminar ou perseguir quaisquer dos trabalhadores, por crença e convicção política — avaliou. 

Em caso de descumprimento, o valor da multa será de R$ 15 mil a cada constatação e a cada trabalhador prejudicado.

Denúncia

Uma notícia-crime foi protocolada ontem no Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais. Ela é assinada pela coligação Brasil da Esperança, formada pela federação Brasil da Esperança (Fé Brasil), constituída pelo PT, PV e PCdoB; pela Federação Psol-Rede, além dos partidos PSB, Solidariedade, Avante, Agir e Pros. É solicitado a instauração de um inquérito policial para investigar o caso. 

A denúncia cita o governador Romeu Zema (Novo), o senador eleito Cleitinho Azevedo (PSC), o vereador e deputado federal eleito Eduardo Azevedo (PSC), o prefeito de Carmo do Cajuru, Edson Vilela (PSB), e o sócio da empresa, Aurélio Nogueira Alves. De acordo o documento, os acontecimentos “potencialmente atentam contra a livre escolha de votos e que, em tese, denotam a prática de crimes eleitorais”. 

Durante o texto, os advogados da Federação citam a mensagem que circulou pelo WhatsApp em convite ao evento, informando data, hora, local, tema ("conscientização eleitoral"). Em trecho: "Convidamos de maneira especial a você que está indeciso ou pensando em votar em branco ou nulo para que possa avaliar melhor seu voto".

— Ocorre que, diante do chamamento ao ato em questão, de propósitos claramente políticos e eleitoreiros, surgiram denúncias de que os funcionários da empresa cedente do espaço do evento, em tese, estariam sendo coagidos a participarem, sob pena de demissão e outros atos abusivos e injustificados de seus empregadores — denuncia. 

O documento, informa a legenda, ao tomar conhecimento de possível eleitoral, denunciou o caso antes do horário previsto para o início do evento ao Ministério Público (MP), que teria interrompido o mesmo. 

— Não obstante, mesmo que por tempo breve, foi possível a alguns dos noticiados darem início ao ato político, tendo praticamente todos os funcionários da fábrica da “Líder Interiores” se dirigido ao local onde ele aconteceria. (...) Em que pese não ter sido possível dar continuidade ao ato político que pedia votos ao atual Presidente da República, ainda assim foi possível realizar o deslocamento dos empregados da “Líder Interiores” para o local do evento, em circunstâncias que denotam, em tese, a prática efetiva do crime de assédio eleitoral — argumenta. 

Indícios

Em anexo, estão as fotos que mostram o interior da fábrica vazio, o deslocamento dos trabalhadores ao local do evento e a palestra em si. 

— (...) o complexo fabril da empresa retromencionada se esvaziou, enquanto lotou-se o espaço cedido para a palestra de “conscientização eleitoral”. 

Outro trecho da petição envolver a descrição do vídeo apresentado aos presentes em que o prefeito Edson Vilela, com destaque para o trecho inicial: "Olá pessoal, uma boa tarde para todos vocês, aí funcionários, colaboradores da Líder e tantas outras pessoas que se fazem presente aí nesse encontro junto com toda a direção da Líder e de outras empresas participando". Com dois grifos, a fala simbolizaria para um evento direcionado aos funcionários da empresa. Durante seu discurso, o prefeito justificou sua ausência devido a um compromisso em São Paulo e pediu votos para o atual presidente. 

As falas do governador também foram descritas, com destaque para a citação nominal do sócio da empresa e "todo mundo aí da Líder". Em sua fala, Zema critica o PT e diz ser preciso "trabalhar para que aquilo que deu certo continue lá em Brasília".

‘Grave’

A notícia-crime cita que, caso confirmado, trata-se de fatos graves, que “transbordaram o direito à liberdade de expressão, notadamente porque emergiram a possível prática de crimes aptos a ferir a lisura do processo eleitoral — e, sobretudo, desestabilizar a ordem constitucional”.

— (...) claros indícios de que sob o manto da liberdade de expressão, possivelmente coagiu-se centenas de operários a mobilizarem-se em direção a evento que pedia votos ao atual candidato à reeleição presidencial — justifica. 

Os denunciantes solicitam a apuração se, efetivamente, houve premissa de manutenção dos empregados apenas em caso de reeleição do atual presidente. Tal conduta se enquadraria no artigo 299 do Código Eleitoral, que prevê reclusão de até quatro anos por “dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita”. 

Diante das evidências, é solicitado o início da investigação para clarear os fatos. É sugerido a solicitação à empresa da lista dos funcionários presentes no evento, a relação de todos os trabalhadores, o relatório com os colaboradores desligados no último mesmo e a informação se foi realizado algum levantamento, ainda que informal, sobre intenções de voto dos funcionários e colaboradores. Outra ação solicitada é a oitiva dos funcionários e colaboradores eventualmente desligados no último mês, “visando esclarecer o motivo da dispensa, assim como a oitiva dos fornecedores que foram constrangidos pelo comunicado”. 

Nega

Quanto às críticas de possível assédio eleitoral, a Líder informou apenas ter cedido o espaço, aberto à população para o evento e não restrito aos funcionários que desejassem participar.

— A Lider Interiores esclarece que a reunião do dia 19 de outubro, nas dependências de quadra esportiva mantida pela Companhia para atividades sociais, ocorreu por cessão do espaço físico e por solicitação exclusiva do Movimento Brasil Acima de Tudo (MBAT), sendo aberta à toda comunidade da cidade de Carmo do Cajuru — disse.

A empresa negou, ainda, ter coagido seus colaboradores a participarem.

 — Sendo tal espaço aberto à comunidade, foi franqueada a participação da população civil em geral, incluindo funcionários da companhia e de outras empresas, caso interessados em acompanhar o citado evento. A participação dos funcionários da Companhia, assim como de toda a população, ocorreu voluntariamente, sem ingerência ou manifestação de qualquer

diretor da Empresa — comentou. 

O departamento jurídico da empresa, cita, já foi acionada para todas as medidas cabíveis contra a veiculação de informações falsas sobre o tema. 

— A companhia manifesta repúdio a qualquer ato que viole liberdades individuais e o direito de escolha de qualquer cidadão, reforçando o compromisso e respeito com seus colaboradores, clientes e com a comunidade, bem como o zelo por sua história — conclui. 

Citados

A assessoria do deputado estadual Eduardo Azevedo informou que o vereador está “extremamente tranquilo”. 

— É um desespero total do PT tentando calar todo mundo. Estão tentando de qualquer forma calar ele, fazer com que ele fique amordaçado nessa reta final, mas não vamos ficar — comunicou. 

O prefeito Edson Vilela informou ter conhecimento da denúncia, mas aguarda comunicado oficial da Justiça antes de se manifestar. 

À reportagem, a assessoria de Cleitinho informou não ter confirmado presença ou mesmo participado do evento, pois estava na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). 

— Nem sabíamos desse evento — justificou. 

Comunicou, ainda, não ser possível lidar com todas as ocasiões em que seu nome é associado a algum evento do qual ele não estava. 

Citado, o Agora também procurou a assessoria do governador Romeu Zema, mas até o fechamento desta página, por volta das 18h, não obteve resposta. 



 

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