A história escrita em folhas de papel

Como os jornais impressos descreveram os capítulos de Divinópolis nos seus 110 anos

 

 

Bruno Bueno

Divinópolis e Jornal Agora cruzam seus caminhos neste 1º de junho. Enquanto a Cidade do Divino completa 110 anos, o único impresso do município comemora o seu 51º aniversário também nesta quarta-feira. Há cinco décadas, as páginas do jornal levam informação com credibilidade, qualidade e veracidade para os divinopolitanos, que se acostumaram a levantar pela manhã e ler com atenção e gosto os cadernos do veículo de comunicação mais tradicional da cidade.

Em tempos nos quais a tecnologia é mais do que essencial, o Agora permanece com sua essência que conquistou a cidade em 1961, sem deixar de levar a informação pelos meios digitais. Desde 2018, com o fim do jornal Gazeta do Oeste, o veículo reforçou seu compromisso de continuar levando a informação por meio de sua tradicional versão impressa.

Além de manter sua edição desde 1961, conserva uma tradição histórica. Há 106 anos, segundo levantamento feito pela reportagem junto ao Centro de Memória Professora Batistina Corgozinho (Cemud), os divinopolitanos têm um jornal impresso à disposição na cidade. O primeiro registro da pesquisa data de 1916, quando Pedro X. Gontijo, um dos fundadores da cidade, publicou a primeira edição do “Conversando com Divinópolis”.

 

Um dos primeiros

Um dos jornais mais antigos do acervo é datado em 28/03/1917. No entanto, o conteúdo descreve o periódico como “ano 2”, ou seja, confirmando que o veículo começou sua circulação em 1916. O “Conversando com Divinópolis”, assinado por Pedro X. Gontijo, servia como principal meio de comunicação para divulgar as ações do governo.

No texto em questão, Pedro faz uma homenagem ao major Francisco Machado Gontijo, que fazia aniversário na semana da publicação. O oficial, inclusive, é um dos principais nomes da história da cidade, sendo peça importante no processo de emancipação. Atualmente, ele dá nome ao viaduto que liga o bairro Esplanada ao Centro. Por meio de uma biografia completa, Pedro condecora Francisco e agradece os serviços prestados na cidade.

O prefeito da época também aproveita o espaço para divulgar informações sobre o alistamento eleitoral. 

— Por editais fixados nesta cidade, sabe-se que já se encontram, desde o dia 23 de janeiro passado, abertos em Itapecerica os trabalhos do alistamento eleitoral. Como se trata de uma questão de magna importância, no próximo número daremos esclarecimentos completos sobre a questão — diz o texto.

Engana-se quem pensa que é de hoje o exercício de levar informações da Câmara Municipal por meio das edições impressas. Pedro X. Gontijo fazia isso há muito tempo. Em 1950, usou seu periódico para criticar ações de vereadores e do prefeito da época, que já não era mais ele.

— A  Câmara fora eleita pelo povo para olhar os interesses do povo, e não dos loteadores. A Câmara continua incoerente e traidora. Cada um tem a sua mania, e a do senhor prefeito é bastante singular: começar serviços em toda parte e não acabar em parte nenhuma — criticou à época.

 

Acompanhar de longe…

Mesmo a milhares de quilômetros de distância, os divinopolitanos também se informavam sobre os eventos históricos que aconteciam do outro lado do globo. As grandes guerras, por exemplo, tiveram cobertura total dos veículos da época. Em 1916, o Jornal Divinópolis trouxe, por meio de seu redator Recenvindo Gontijo, vários detalhes sobre as ocorrências da primeira guerra mundial, incluindo negociações uruguaias com o Brasil e os conflitos entre Portugal e Espanha.

Em 1944, o Divinópolis Jornal (não confundir com Jornal Divinópolis) divulga a “última tentativa” de Adolf Hitler, comandante do regime nazista, para vencer a segunda guerra mundial. O fuhrer, como era conhecido, nomea Joseph Goebbels, ministro da propaganda e um dos grandes responsáveis pela fidelização dos alemães ao regime, como administrador de Berlim, capitão da Alemanha.

20 anos depois, o Jornal A Semana noticia o discurso do general Artur da Costa e Silva sobre uma possível revolução. O que muitos não sabiam é que a palavra utilizada pelo oficial previa a ditadura militar no país. Ele, inclusive, seria o presidente mais sangrento do regime, instituindo o AI-5. O periódico divinopolitano, contudo, relata a fala de Artur como “Ecos de uma revolução abençoada”.

 

E de perto

O levantamento também buscou analisar como os periódicos divulgaram os principais eventos históricos de Divinópolis. A edição histórica de meio século da cidade, em 01/06/1962, elenca os destacáveis eventos do município nos primeiros cinquenta anos. A capa do Jornal A Semana, principal periódico da época, define o município sob três pilares: cidade de Deus, do futuro e dos homens. 

Seis anos depois, no 56º aniversário de Divinópolis, o Jornal A Semana, que dominava as bancas da época, noticia a inauguração do Hospital São João de Deus, cumprimentando diretamente Geraldo Corrêa, fundador da instituição.

— Feliz quem como Vossa Senhoria pode definir, neste gesto criador, a grandeza de sua solidariedade humana e o calor de sua amizade a Divinópolis — agradece o redator do texto ao fundador.

Com a renúncia de Fábio Botelho Notini, o Jornal A Semana também noticia, em 22/05/1982, a posse de Galileu Machado como prefeito de Divinópolis. Com uma nota curta e uma simples biografia, o periódico deseja boas vindas ao gestor que, posteriormente, se tornaria o Executivo com mais passagens pela Prefeitura. 

Outros vários fatos históricos foram noticiados pelos jornais da época. Entre eles, se destacam as fundações do Divinópolis Tênis Clube, Usina do Gafanhoto, criação da Cidade Universitária, construção do atual viaduto do Porto Velho etc. Desde sempre, o divinopolitano confiou na informação dos diários impressos, que descreveram a história em folhas de papel.

 

Acervo

O grande acervo da Cemud conta com milhares de jornais publicados em  Divinópolis e região. Destacam-se: A Esquerda, A Estrella do Oeste, A Flama, A Liberdade, A Manhã, A Noite, A Penna, A Semana, Divinópolis, do Oeste, Flecha, Folha de Minas, Gazeta Popular, Gazeta Sanitária, Gente Nova, Minas Geraes, O Acadêmico, O Arauto, O Centro, O Clarão, O Dia, O Clarim, O Diário, O Gráfico, O Grêmio, O Linguarudo, O Popular, O Ristillo, O Sentinela, Oeste Mineiro, Pela Vida, Porta-voz, Reformador, Tribuna Livre, Vanguardeiro, Vitaminas, Voz Democrática, Vozes da Vitória e muitos outros.

De acordo com a  museóloga e analista universitária do Cemud, Kátia Maise, os documentos históricos chegam por meio de doações. Ela destaca a importância do trabalho.

— É de extrema importância contar e preservar a história de Divinópolis. Nós tratamos como patrimônio. O acervo também serve de estudo para várias áreas, como história, economia, saúde e muitas outras. Diversos pesquisadores vêm à sede e fazem trabalhos. A preservação dessa identidade é essencial — conta.

Ainda conforme a especialista, qualquer divinopolitano interessado em conhecer um pouco mais sobre a história da cidade pode visitar o Cemud. 

— Nós ficamos abertos de segunda a sexta-feira, sempre das 8h às 22h. Não é necessário agendamento, mas recomendamos para que nossa equipe possa realizar uma pesquisa prévia sobre os documentos que serão necessários para o estudo. Não precisa ser pesquisador para conhecer, apenas ter vontade de aprender um pouco mais sobre a história. Estamos esperando todos — finaliza.

O Cemud fica no bloco 4 (sala 405) da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), localizada na avenida Paraná, 3001, bairro Belvedere.  O telefone para contato é o (37) 3229-3553 e o e-mail é [email protected]

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