110 anos de divina poesia
Cláudio Guadalupe
110 ANOS DE DIVINA POESIA
Contar a história de 110 anos de Divinópolis, na perspectiva da literatura, sobretudo da poesia, é um desafio! É festejar a emancipação do município pelo olhar poético! Como é reconhecida Divinópolis por pessoas de outras cidades e estados? Ah, a terra da Adélia Prado! A poesia está, por assim dizer, “na veia”.
Comecemos a nossa viagem histórica poética pela Academia Divinopolitana de Letras – (ADL), há 60 anos. A ADL foi criada por decisão de Sebastião Bemfica Milagre, José Maria Álvares da Silva Campos, Carlos Altivo e Jadir Vilela de Souza, que logo organizaram uma assembleia na Biblioteca Pública Municipal Ataliba Lago e elegeram Gentil Ursino Vale como primeiro presidente da entidade e seus doze acadêmicos na época. E, agora, completando os 60 anos de existência, consolidou-se a sede própria da ADL (bairro Esplanada), sob a presidência de Flávio Ramos, e recentemente foi eleita a primeira mulher para o cargo, a poetisa Maria Imaculada.
Mas Divinópolis foi, sobretudo, reconhecida nacionalmente e em Minas Gerais, pelos movimentos coletivos de poesia/literatura. Nos anos de 1960, o movimento literário AGORA (1967/1969), com os escritores Fernando Teixeira, Lázaro Barreto e Fabrício Augusto, à frente, produziu doze edições do suplemento, divulgando mais de sessenta e sete autores novos (entre eles a Adélia Prado, Oswaldo André) e mais de vinte autores já consagrados.
Mas o Movimento AGORA foi mais que um jornal literário. Foi um movimento que organizou as Semanas de Arte, saraus poéticos, peças teatrais e encontros de poetas do interior, entre tantas outras atividades. E Lázaro Barreto foi a peça central do movimento. Daí a homenagem singela:
MEL E VENENO
(Lázaro Barreto. Mel e Veneno, 1984)
Aurora ainda enluarada
Manava dos seios da mulher.
Um líquido colorido esguichava
De minha pressão arterial.
Mel e veneno minavam aqui e ali.
Vi nuvens inventando cores e
Sapos de cócoras no adro da igreja.
Subi às torres e perguntei.
Desci aos vales e perguntei:
Com quem discutirei minha loucura.
Outro movimento importante foi o jornal literário DIADORIM, criado pelo frei Márcio e Lázaro Barreto, que teve 17 edições em dois anos de vida (1971/1973 – os anos de chumbo), e lançou em suas páginas, mais de 92 escritores municipais, nacionais e até internacionais, com destaque para Oswaldo André, Adélia Prado, Lázaro Barreto, Mário de Oliveira e Marcantônio Guimarães.
Depois vieram o Interior (1980) e o Caçarola (1991) pelas mãos de Lázaro Barreto, David Raposo, Juvenal Bernardes, Wellington de Oliveira, Fernando de Oliveira e outros.
Neste um século de literatura, outro movimento importante foi o DAZIBAO (1981/1993 e 1994/1996), com a nova poesia, de Camilo Lara, Marcus Vinicius de Faria, Nilson Penha Silva, Otávio Paiva (Cuca), Wellington Messias de Oliveira, David Raposo, Adriana Versiani, Juvenal Bernardes e Carlos Antônio Lopes. Houve publicações de dobraduras, livros e a Coleção Dazibao. Nessa coleção, veio ROTEIROS, em homenagem a Divinópolis e encontramos uma programação visual primorosa de Carlos Antônio Lopes e poemas como esses:
CANÇÃO DO EXÍLIO
Márcio Almeida (2003)
Minha terra tem Palmérios
Onde cantam sábios ahs!
Aves que raimundocorreiam
Não Borgeiam como em Ucbar
O RIO
Wellington Messias (2003)
& o rio é a água & sua margem
& O olho é o contorno & o espelho
De sua passagem.
Nos anos 2000, outro movimento balançou Divinópolis, o BARKAÇA, que integrava poesia, música, artes plásticas e levou o nome da nossa poesia em intervenções em várias partes do país. No movimento, destacam-se Carlos Antônio Lopes, Luis Mingau, David DiOli, Juvenal Bernardes (Nanal), Oswaldo André, Hevecus e outros autores da cidade.
PARA HEVECUS
David DiOli
quando o poeta morre
não é só o poeta que morre
morre o verbo dele/
: a letra dele também morre
quando morre um pintor
não é só o pintor que morre
morre a pincelada dele também/
: a voz dele também morre
morre o azul que nos socorre
No século XXI, uma nova leva de autores vêm defendendo a poesia de rua, como o Oficina da Rima (raperrs), o Coletivo Vira Verbo e o Coletivo ARTEFERIA. Este, nos seus quase três anos de existência, já publicou oito fanzines, com novos autores. Leia o poema abaixo de um dos arteferianos:
MEU CANTO (Hai Kai)
Cláudio Guadalupe (2022)
Assim é o meu canto
Delírio e Lucidez
Grito mais HUMANO.