Reinos particulares

Leila Rodrigues

Saí do metrô lotado e peguei a calçada. Apressada como todos ao meu redor, fui caminhando no meio da multidão. Era apenas eu. Eu sem sobrenome, eu sem nenhuma identificação a não ser o documento que eu carregava na bolsa. Tive medo. Caminhei mesmo assim. Caminhei no automático até o lugar costumado para pegar um táxi. Devo ter andado uns cinco quarteirões lotados de gente. E foi ali, naquele percurso interminável de 10 minutos, que eu entendi que eu era apenas mais um.

Cada um de nós é alguém no seu reino. É filho, é pai ou mãe, é amigo, é o que canta, o que dança, o que sabe fazer uma boa feijoada, enfim, somos sempre alguém no nosso minúsculo reino. E isto nos conforta. Conforta a ponto de acharmos que somos muito, que somos muito importantes, que somos mais importantes que outros ou até que somos os melhores. 

Até o dia em que saímos deste reino e enfrentamos o mundo lá fora! Aí, sim, vamos experimentar a maravilhosa alegria de sermos apenas mais um! A experiência de sermos uma pessoa comum, vulnerável como qualquer outra, correndo os mesmos riscos e dispostos a qualquer fato. A chuva vai pegar qualquer um que esteja na rua e o vento vai tocar todos os rostos que encontrar pelo caminho. Somos apenas mais um na fila. Mais um sem nenhuma vantagem, sem nenhum ponto a favor acima dos demais. 

Sentei-me no banco de trás do taxi e fiquei observando a cidade. Atravessar São Paulo às 16h de um dia comum é sempre uma experiência. Calada, apenas observando as pessoas no caminho, eu pude medir o meu tamanho real. Minhas conquistas tão minhas, tão grandes para mim, quando diluídas num rio de gente, sumiram. Meus problemas, tão intensos para mim, se perderam no monte de problemas de cada um. Eu era apenas mais um. E me aceitei feliz como uma pobre mortal.

Cercados de mimos e de quem possa nos proteger e aplaudir, seremos cada dia mais fracos e dependentes. É confortável ser “a moça que escreve no jornal”, “a filha do sr. Déco”, “a da empresa tal” ou a “esposa do fulano”. Estamos sempre amparados por alguém. E o amparo é uma cadeira quente e confortável. Enquanto estivermos sentados na zona de conforto, diariamente seremos coroados como reis de um plebeu só, nós mesmos.

Desci do táxi agradecida pela viagem e, pela primeira vez, olhei no olho do taxista e desejei bom trabalho para aquele que não era maior nem menor do que eu, apenas mais um como eu. E ele me retribuiu sorrindo, para a senhora também!

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