Precisamos ou não de heróis?

“Infeliz a nação que precisa de heróis”, escreve Bertold Brecht. A fragilidade dos humildes clama aos céus. Em tese, o dia a dia de uma vida dedicada é considerado um valor. Ou: o valor. Na prática, boas obras não se destacam na mídia. Também, nem dão ibope.

Santos canonizados, vemo-los incomuns, dando-nos a impressão de que se fizeram santos depois de mortos ou já houvessem nascido predestinados. Cria-se, no imaginário, uma auréola, atribuível apenas a uns poucos eleitos. Enquanto isso, “Juntos do sólio e da opulência opima”, com um salário miserê de R$ 24 mil, “mil párias disputando aos cães um osso” (poeta Raimundo Correia): escravizados, escabelo debaixo de pés opressores. Ser santo não significa ter sido perfeito. É verdade que há uma encumeada de santos notáveis, como esses cinco “Santos que abalaram o mundo”, conforme seleção de René Fülop Miller: S. Antão, S. Agostinho, S. Francisco de Assis, S. Inácio e Santa Teresa.

No romance O Advogado do Diabo (1959), Morris West leva à reflexão o prefeito da Congregação para a Causa dos Santos. O cardeal está para enviar monsenhor Blaise Meredith a um lugarejo do Sul da Itália, a fim de colher dados para a beatificação de um cristão falecido com odor de santo: “Um número demasiado grande de santos pode desacreditar a santidade. Por mim, sempre julguei que nossa função nesta congregação... era antes não os colocar no calendário litúrgico, mas conservá-los fora dele”.

A comemoração litúrgica de Todos os Santos inclui “todos os santos e santas de Deus”. A santidade em pessoa, como uma Irmã Dulce, mora ao lado, ainda que eclipsada pela onda de violência destacada pela mídia. Os políticos podem fazer mais que uma santa Irmã Dulce. O que ela fez, e fez despojadamente, foi suprir, na medida do possível, as muitas lacunas de nossas autoridades legislativas, executivas e judiciárias. Que nem sempre olham de fato para quem precisa. Já imaginaram um político canonizado? Faço votos.

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