Perspectivas da verdade

“Blá, blá, blá...” eis o que todos proferiam em resumo.

De certo, dentre a multidão, há de ter alguém que concorde comigo.

Aquele calor que acariciava brutalmente o meu cenho pouco vistoso, conduziu-me a elaborar uma questão: estaria no mesmo barco daqueles estúpidos e desprovidos de qualquer habilidade mental?

Teria eu que buscar dentro deste calor a sangue frio, teria que desperdiçar-me e despedaçar-me, entrar pelas narinas de cada um e poder sufocá-los até entendê-los ou entendê-los até sufocá-los; poder ver morrer neles suas inatividades e crenças.

Todos estavam ali por uma razão. Razão esta que só poderia fazer de fato alguma lógica - ainda que abstrata - se fosse de teor religioso, empírico ou até mesmo absurdo.

Por que eu estava lá? Será que começava a desacreditar de meus conceitos? Não... espero que seja por um motivo absurdo.

É o que desejo do fundo da minha... racionalidade! Fui feito homem pela evolução e não queria ter que fazer revolução pra entenderem que todos são tambémhomens. Ao menos que... não seria possível... será que não são homens?

Nascera uma árvore frutífera em meio aos meus pensamentos incessantes; seus galhos de ideias me conduziram a uma hipótese: estivera eu adentradonuma realidade irreal, a qual era completa e perfeitamente natural depositar as esperanças e sonhos fantasiosos em um Ser que, ao menos nessa teoria deselegante, compreende, decide e joga com o destino de todos os seus seguidores?

Talvez, só estivesse com inveja... inveja por não ter a capacidade inata de ignorar as várias fases da verdade (mesmo as destruidoras de felicidades).

O tempo pareceu parar enquanto raciocinava sobre o tempo em si(...).

De repente, no meio daquele bafafá, olhei de modo distraído para os 180 graus que havia concedido meu pescoço. Fiquei surpreso, pois a cidade toda parecia estar ali!

Com certa dificuldade em chegar à frente - impregnando-me com a insanidade mesclada ao odorque emanava daqueles que mais se assemelhavam àanimais(isolados de todo o conhecimento) e que fizeram o ultraje de pertencer a raça humana unicamente por aparência e o mesmo tipo anatômico -para que pudesse acompanhar o que havia chamado tanta atenção.

Fosse o que fosse,entorpecera até os cães: dos mais altos e sarnentos até os que pareciam“extensões” dos mendigos - que usufruíam de suas companhias caninas pelo simples fato de os mesmo não poderem expressar suas insatisfações.

O crepúsculo trazia consigo um vento gélido que veio ao meu encontro sem qualquer pudor, fazendo espirais parecendo dançar no ar.

Deparei-me, admirando o luar que enfeitara aos poucos o seu véu negro, com uma bizarra sensação; certamente era a pior que eu já sentira!

Em minhas veias não corriamhemácias, glóbulos, sangue... nada! Constatei este fato após observar que não possuía sequer pulsação.

Hesitaste em prosseguir (tanto em meus pensamentos quanto em rumo ao meuobjetivo inicial), porém estava a alguns passos de descobrir o moti... Não! Não seria possível queaqueles incessantes slides de imagens que meu cérebro convertera como sendo a representação de minha realidade - ou mesmo de alguma outra - fossem reais...!

Era um espelho. Não qualquer espelho. O maior que já havia visto: sua altura quase não era acompanhadapor um fim; o mesmo era verdadeiro em relação à sua largura.

Como eu não o tinha percebido antes?!

Foi então que, ao procurar o meu reflexo, compreendi que a solução (prévia) de todos os meus questionamentos, mesmo os que ainda não estavam em nível consciente, estivera lá o tempo todo!

Aquele magnífico espelho, que era moldado com pedras preciosas e raríssimas, refletira não a beleza externa, mas sim a verdade escondida em cada um dos que o olhavam, buscando nele suas vaidades, utilizando-se de conceitos patéticos e padrões de estéticas.

Foram hipnotizados, um após o outro, pelo refletor peculiar.

Depois de um tempo de aparente transe, muitos não aguentaram encarar as suas maquiavélicas imagens e a verídica representação de seu mundo como todo, sofreram um mal súbito e faleceram - caindoem sequência como um efeito dominó.

Eu conheci a verdade... O que o ser humano tem dentro de si: suas reais crenças e construções do pensar. Estava tudo a meu alcance...

Todavia, o meu reflexo era diferente, curioso e assustador!

Eu não era provido por ossos, células, ou mesmo, moléculas.

O susto derivado da minha maldita curiosidade fez com que me sentasse abruptamente no chão.

Lembranças me bombardearam;recordações vieram junto a um profundo desgosto! Eu fora concebido das entranhas de várias mentes que projetaram cada ato, cada particularidade que viesse ter. Deram-me uma consciência, inteligência acima da média (baseado no coeficiente intelectual), e meus pensamentos pré-moldados.

Um ser artificial, desprovido de quaisquer sentimentos, tendo só uma base matemática do que cada um destessignificavam.

Enquanto eu tentava fazer esta digestão - ou melhor, o processamento- da estapafúrdia e atormentadora circunstância, os humanos que, fosse por acaso ou sorte, ainda estavam vivos e, depois de certo tempo,continuaram a conversar o que eu traduziria como: “blá, blá, blá...”.

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