Os opostos

Argentina e Brasil, duas grandes nações da América Latina, se separam, territorialmente, por uma linha de 2.236 km. Daria para perceber as semelhanças econômicas, políticas e culturais entre si. São dois povos, originários de metrópoles, também vizinhas, de distintos idiomas, mas que, na sua construção, muitas são as palavras iguais, no falar e na grafia. Há expressões cujas discrepâncias são imperceptíveis. Veja esta manchete, de um jornal buenairense, edição recente: “Estamos todos en el mismo barco”. São duas irmandades exploradas pelo mesmo patrão, nas armas, na economia e politicamente, as quais sofreram os horrores de ditaduras sanguinárias. Juntos, sentiram a agonia dos torturados e mortos nos cárceres.

Quanto às raízes históricas, entretanto, não combinam. No século XIX a Inglaterra queria impor ao Novo Continente, especialmente nas colônias que se declaravam autônomas, a incipiente economia de mercado. A partir daí surgem fortes reações, que ainda continuam. José de San Martín, em 1812, deixa Londres, carregado de cultura revolucionária francesa, portando mensagens de mudança, não só para seus irmãos argentinos, mas a quem pleiteasse sua colaboração. Tornou-se um dos mentores intelectuais na Independência da Venezuela, liderada por Bolívar, Francisco Miranda e o brasileiro Abreu e Lima. O Congresso de Tucumán, que ele preconizava, deu as coordenadas de Soberania da Argentina, em julho de 1816.

A geografia do Brasil não permitia a concentração da luta emancipatória, salvo esporádicas manifestações, inclusive bélicas, porém de menor magnitude. Uma população dispersa, condicionada a um mandatário “mandalete”, D. João VI, vindo de Portugal em 1808, por medo de enfrentar tropas de Napoleão. Retornando à sua Pátria, a calmaria se transforma num frenesi coletivo, criando na pessoa de D. Pedro uma imagem de tutor. Afinal, num gesto monocrático, solta o famoso Grito do Ypiranga!

Os personagens, hoje, têm outros nomes: San Martín agora é Alberto Fernández, e D. João VI, Bolsonaro, cada qual com seu mérito histórico. Na inauguração do ano legislativo, o discurso do presidente argentino, deixa escapar essas palavras: “Há uma Argentina mais justa que nos devemos”; “Nunca mais a porta giratória de dólares, que ingressam por um endividamento e se fugam deixando uma terra arrasada”; “Toda sociedade necessita respeitar o direito de cada um...”. A campanha, pela recuperação da soberania das Malvinas, não foi esquecida. Disse Bolsonaro: “Se infectei alguém, a responsabilidade é minha”. No seu governo, a base de Alcântara será entregue aos EUA, o Congresso Nacional e o STF fechados, além dos trabalhadores sem direitos. Estão nos campos opostos.

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