Os “doutores” da lei

Ellen Ariadne Mendes Lima 

Para muitos, o curso de bacharelado em direito é uma espécie de “carta na manga” para todo e qualquer segmento de carreira profissional.  Ser um profissional que “domina as leis” ou um “doutor” já é um pré-requisito para ter sucesso. Mas será que ainda existe esse pensamento?

Com 20 anos de profissão, certamente falo com propriedade: o desafio é diário. O que nos destaca em nosso meio é e sempre será a dedicação, estudo constante, a forma de atender nossos clientes e a forma como lidamos com os diversos segmentos da Justiça.

Sou de um tempo em que os advogados eram pessoas diferenciadas, dotadas de uma cultura invejável, estudiosos não somente de leis, mas de todas aquelas questões sociais, políticas e filosóficas que envolviam a sociedade, e dessa forma sempre quis ser “doutora”.

Atualmente, o título de doutor é conferido pelas universidades aos estudiosos que, após concluírem curso de graduação, ingressam em curso de pós-graduação (doutorado) e, mediante defesa de uma tese, adquirem o título em questão, passando ou não pelo mestrado ou outro curso de especialização. Academicamente falando, esta é a forma de se conseguir o título de “doutor”.

Ocorre que, em se tratando de advogado, ainda está em vigência a Lei do Império de 11 de agosto de 1827, que cria dois cursos de ciências jurídicas e sociais, introduz regulamento, estatuto para o curso jurídico e, em seu artigo 9º, dispõe sobre o título (grau) de doutor para o advogado.

Está assim disposto conforme o texto original: “Art. 9.º - Os que freqüentarem os cinco annos de qualquer dos Cursos, com approvação, conseguirão o gráo de Bachareis formados. Haverá tambem o gráo de Doutor, que será conferido áquelles que se habilitarem com os requisitos que se especificarem nos Estatutos, que devem formar-se, e sò os que o obtiverem, poderão ser escolhidos para Lentes” (sic).

Portanto, legalmente falando, o(a) advogado(a), habilitado(a) segundo o estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, é “doutor”.

Em que pese o termo “doutor” se referir aos que possuem doutorado, pois alguns defendem que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96) teria derrogado o termo quando se estabeleceu o que precisa para alguém ter o título de doutor, no meu lidar com os colegas de profissão, sempre os chamei e os chamarei de “doutores”, pois para mim o são, legalmente, historicamente e como uma forma de tratamento, gentileza e respeito de quem comigo se relaciona.

Mas, não basta ter o direito legítimo de sermos chamados de “doutores”, há a necessidade de que cada profissional da advocacia o seja por “excelência”, com o mesmo significado dos dicionários para o grau elevado de perfeição e a qualidade daquele que é excelente.  

Com essa breve reflexão, entendo que é preciso resgatar o romantismo da advocacia antiga, adaptando-a ao mundo moderno, contemporâneo, que demanda agilidade e eficiência, mas nos aprimorando cada dia mais a sermos “doutores por excelência” e cidadãos de bem, diferenciados, exercendo a advocacia no seu sentido amplo, combatendo normas que ferem as diretrizes sociais, atos do poder público e decisões judiciais confrontantes com o ordenamento jurídico e, contrários aos interesses da coletividade.

O presente texto é para entender/esclarecer e nunca criticar quem pensa o contrário e as discussões sobre esse tema são amplas e me divertem. Assim, finalizo dizendo que definitivamente sou uma “doutora”, mas pode me chamar de Ellen, grata!

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