O que Diniz nos diz?

Que tal a Secretaria de Cultura assumir a frente de um projeto para enfrentar os tempos de confinamento da pandemia com os talentos locais?

Marcio Almeida Jr.

Nestes tempos de pandemia sem vacina suficiente, em que ficar em casa pode fazer a diferença entre a saúde e a doença, ou entre a vida e a morte, a cultura pode ter muito a nos dizer. O setor reúne, como poucos, potencialidades que podem contribuir para tornar menos difícil e, quem sabe, mais suportável, o isolamento indispensável. Não conheço o plano de gestão do secretário de Cultura de Divinópolis, Diniz Borges Filho. Nem sei, aliás, se já houve tempo e tranquilidade de elaborar um planejamento e não julgarei o secretário se não o fez até aqui, em circunstância tão adversa. 

Presumindo, porém, que Diniz considere a necessidade de alinhar metas, estratégias e ações que as possam viabilizar, como é usual em políticas públicas, forneço a seguir alguns conselhos não solicitados e talvez um tanto impertinentes. Se forem por demais inadequados, terão como único culpado este que vos escreve e, se em algum ponto, parecerem ao menos parcialmente aproveitáveis, terão um largo débito para com vários amigos e amigas divinopolitanas que os inspiraram. Vamos a eles do modo mais direto possível, para não cansar sua paciência, caro leitor e cara leitora do Agora, nem a do secretário Diniz, caso se disponha a lê-los. 

Por que não criar nestes dias sombrios uma live musical semanal destacando artistas divinopolitanos, todos com os cachês devidamente pagos pela municipalidade, que também se incumbiria da logística necessária às apresentações? (Nada de querer trabalho de graça de membros da mais penalizada das categorias profissionais.) Meu amigo Gê Lara, ilustre representante da genialidade musical divinopolitana, provou, em suas agora tradicionais lives da manhã, que isso é possível e, a meu ver, credenciou-se à direção musical do evento. Está aí, penso, uma oportunidade de revelar novos e tradicionais talentos, que podem, aliás, se juntar em criativos encontros.

Por que não criar sob os auspícios da municipalidade outra live semanal, desta vez literária, para que se leiam textos dos riquíssimos autores divinopolitanos? Minha sugestão (peço desculpas por só citar amigos, mas não há outros a quem eu conheça tão bem) para coordená-la recai sobre os poetas Mingau e Cíntia Teixeira, artistas de primeiríssima qualidade. Cíntia é hoje uma referência impressionante na leitura de poemas. Mingau tem o mesmo brilhantismo, assim como Juvenal Bernardes, que em vida é patrimônio cultural desta terra. Sugiro aqui, como na música, a mistura de antigos e novos talentos locais. Gostaria de ver, por exemplo, a rapper Karen Pedrada e o poeta Fernando Teixeira dividirem a mesma edição com seus textos. Seria uma mistura, no mínimo, inspiradora e, ao mesmo tempo, reveladora da multifacetada cultural divinopolitana. Tenho a ousadia de propor a parceria da entusiasmada equipe da Biblioteca Ataliba Lago e da Academia de Letras, sem esquecer o editor Daniel Bicalho, figura-chave da cultura local, unanimidade sensata, construtiva e agregadora entre as nossas muitas divergências de visão cultural.

Mas não nos esqueçamos das crianças. Por que não juntar os talentosíssimos contadores de histórias locais e os artistas do teatro e produzir, com a logística e o suporte financeiro do setor de Cultura, que pode contar com patrocínio para esta e outras propostas, algumas peças em live que levem fantasia a meninos e meninas presos em casa por um vírus que, em sua pouca idade, ainda procuram entender? Estão aí, para tanto, Mariana Bernardes, Denise Bicalho e tantos outros e outras que a memória poderia evocar, mas que deixo subentendidos, como diria o filósofo contemporâneo Lulu Santos, para que a lista seja completada por quem se interessar pela ideia.   

E há mais. Defendo há anos a ideia de que Divinópolis tem tudo para transformar-se em um polo nacional e internacionalmente conhecido de produção de conhecimento em psicanálise. Sendo assim, lanço mais uma das minhas imprudentes provocações: por que não organizar, sob a égide do setor de cultura da Prefeitura, um grande seminário aberto de lives sobre temas da vida contemporânea? Uma terra que tem gente do porte de Cláudia Leite e Alexandre Simões e os talentos do grupo Parlêtre não deve nada a ninguém em termos de profundidade analítica e seriedade científica. Por que não ter aqui nosso ciclo de encontros virtuais com psicanalistas de diferentes tendências, assim como psicólogos, pedagogos, psiquiatras, neurologistas e profissionais de outras áreas afins? 

E o mesmo poderia ser feito em relação à gastronomia, outro setor em que Divinópolis apresenta potencial extraordinário. Por que não promover encontros saborosos entre meus amigos Clarissa Almeida, Rogério Duarte (que também joga no time da psicanálise) e Juliano Soares, aos quais podem se juntar os muitos chefs e sommeliers que ainda não conheço tão bem, mas que podem ser lembrados por todos os interessados? E ponham-se na lista jovens talentos como Manuela Bosco, que será (anotem aí, amantes da boa cozinha) a próxima estrela de primeira grandeza na constelação da gastronomia divinopolitana, responsável, aliás, por um projeto que procura mapear os talentos da cozinha local.

Entre muitas outras ideias, paro com a seguinte, para que a paciência, como prometi, não seja esgotada. Nestes tempos em que a incerteza é a única coisa certa, em que se torna cada vez mais necessário pensar em possibilidades e divisar o futuro, por que nossa Secretaria de Cultura não convoca as brilhantes Clícia Machado e Mivla Rios para mostrar ‒ junto, quem sabe, com o antenado arquiteto Renato Almeida ‒ as tendências da economia, da cultura, da vida social, da moda e dos modos de vida? O trabalho que têm feito nessa área é, no mínimo, de extraordinária relevância e ficaria muito bem em um ciclo de conversas sobre tendências da contemporaneidade.

E fico aqui, com várias ideias borbulhando na mente, esperando não ter cansado o leitor e a leitora com meu incontido entusiasmo em relação aos homens e mulheres desta terra tão criativa, que tem tudo para apresentar uma resposta de alto nível cultural às dificuldades do momento pandêmico. Não se sinta o secretário obrigado a dar resposta, muito menos a concordar com uma programação cultural que não solicitou e que talvez nem lhe pareça adequada. São só provocações, admito, mas feitas de bom coração por alguém que há anos pensa sobre a importância da vida cultural.    

 

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