Manual editado pelo MPMG aborda afetividade e respeito aos animais

Da Redação

Nesta terça-feira, 22, data que marca, no Brasil, o Dia da Defesa da Fauna, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio da Coordenadoria Estadual de Defesa da Fauna (Cedef), promoveu o lançamento do guia “Animal não humano: presente!” em um evento virtual transmitido ao vivo.

Da Redação

Editado pelo MPMG e escrito pela doutora em educação Aleluia Heringer Lisboa Teixeira, o guia provoca questionamentos sobre as condições de vida dos animais não humanos, sobre os usos e as representações que os animais humanos fazem deles e sobre o que tem sido perpetuado de forma equivocada. Para isso, parte de situações familiares para os leitores na relação com os bichos e de casos de maus-tratos que são denunciados pela população ao MPMG.

— Se eu conseguir ler nos olhos do meu cachorro, por exemplo, que ele é um ser que sente, que não deseja e não deve ser maltratado, se eu conseguir dar essa virada de chave na minha cabeça, eu consigo enxergar as outras relações também — acredita a autora.

A publicação é voltada principalmente a educadores e conta com o apoio do Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG), da Associação Regional de Proteção Ambiental (Arpa) e da ONG Rock Bicho. Ela já está disponível em formato digital no site do MPMG e também será enviada, em versão impressa, a milhares de escolas públicas e particulares do estado.

Além de Aleluia, que ocupa também o cargo de diretora do Colégio Santo Agostinho Contagem e é líder de sustentabilidade da Sociedade Inteligência e Coração (SIC), participaram do lançamento do guia a coordenadora da Cedef, promotora de Justiça Luciana Imaculada de Paula, o promotor de Justiça Júlio César Luciano, da 15ª Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, Patrimônio Histórico e Cultural de Belo Horizonte, a presidente do Sinep-MG, Zuleica Reis Ávila, o capitão José Fernandes de Paula, da Arpa, e a diretora da ONG Rock Bicho, Eliana Malta. O evento foi conduzido pela jornalista do MPMG Thaís Dutra.

Conscientização

Conforme Luciana Imaculada, muitas questões que envolvem o sofrimento animal passam despercebidas no cotidiano da maioria das pessoas, mas, infelizmente, ocorrem todos os dias, nos espaços públicos e privados, e são relatadas, com frequência, ao Ministério Público por cidadãos e instituições que estão atentos ao problema. Alguns exemplos são o aluguel de burros para dar volta em quadras de escola, em condições nocivas para os animais, a coloração de pintinhos, a exploração de bichos em circos, entre outros.

— São demandas concretas que recebemos sempre e que precisam ser enfrentadas. O guia atende a uma demanda da sociedade e busca transformar essa realidade pela educação — salienta a promotora.

Ao longo de suas 64 páginas, compostas por textos e imagens, a publicação abre janelas para que os leitores possam revisar concepções e práticas, percorrendo o caminho da afetividade e do respeito aos animais não humanos.

— Há, no tempo chamado hoje, um imperativo humano, ético, moral, cultural, social, ecológico, político, econômico e legal que nos tensiona e nos pressiona a que possamos rever a forma como nos relacionamos com os animais não humanos — aponta, já na introdução, a autora, que trabalha há mais de 35 anos na área da educação e há mais de uma década deixou de consumir produtos de origem animal.

Aleluia esclarece que, embora a publicação seja voltada especialmente para educadores formais, todas as pessoas atuam, de alguma maneira, como educadoras nos seus círculos sociais, o que torna o guia útil para toda a população.

— A relação que as crianças estabelecem com os animais é mediada pela família, pela escola e pela sociedade em geral. Elas aprendem por meio de exemplos e dos métodos de ensino, da educação formal e não formal. Assim, devemos entender que todos somos educadores.

A autora observa que vigora na sociedade uma desastrosa visão antropocêntrica, responsável por categorizar os outros animais conforme os interesses dos animais humanos, determinando, por exemplo, aqueles que são destinados a testes, à alimentação, a entretenimento, entre outras finalidades.

— São muitas as formas de exploração, e toda essa cena acontece sem a cobertura da ética. Eu posso ver um burrinho sendo explorado no sol, sem comida e sem cuidados, e posso achar que pra ele tanto faz. Não fomos educados para enxergar o animal de outra forma, então naturalizamos isso.

A autora acredita, contudo, existir, hoje, uma geração completamente diferente e sensibilizada para os movimentos de respeito aos animais, que se beneficia, em grande medida, da facilidade de acesso a novas visões de mundo possibilitada pela internet. “As redes sociais ampliaram as conexões e a divulgação de conteúdos. Ao lado disso, está também a influência dos movimentos de respeito pelas minorias”, analisa.

Leitura transformadora
Júlio César Luciano destaca que, apesar de sucinta, a publicação apresenta grande profundidade e é capaz de gerar muitas transformações. “Nenhuma pessoa será a mesma após a leitura deste guia. Tenho certeza que todos vão se identificar com alguma situação tratada e serão levados a desenvolver um pensamento crítico pelo menos quanto àquela questão com a qual se identificou”, afirma.

O promotor ressalta, ainda, que o material toca em pontos polêmicos, que precisam ser debatidos, como a crença de que existem lutas que não devem ser travadas, por serem supostamente menos importantes, e o uso de animais para pesquisa científica.

De acordo com Júlio César, os seres humanos têm o dever moral de cuidar dos outros seres, que não podem lutar pelos próprios direitos. “Enquanto nós, animais humanos, temos a capacidade de falar, de nos agruparmos, de lutar por uma causa – o que nos diferencia –, nós temos a obrigação moral e ética de lutar pela causa daqueles que não podem fazê-lo. Em um planeta, se um dos seres não estiver bem, a totalidade não estará”.

Quebra de paradigmas
Sobre a necessária mudança na relação entre animais humanos e não humanos, Zuleica Ávila destacou, no lançamento virtual do guia, o papel fundamental da educação para a modificação de hábitos. “Muito se fala em sair da caixa. Sair da caixa é quebrar paradigmas, é modificar costumes que até então não víamos como nocivos, mas que, ao ampliarmos nossa visão – o que o guia possibilita – percebemos como são contrários ao nosso discurso”.

A presidente do Sindep-MG parabenizou o MPMG pela iniciativa de elaboração da cartilha e ressaltou a relevância do trabalho da instituição junto à sociedade. “Quando a gente fala em Ministério Público, as pessoas geralmente demonstram certo receio. Acham que é um órgão destinado apenas a investigar e a multar. Porém, a gente vê a dimensão do trabalho do Ministério Público. É um órgão educativo, que a ajuda a formar indivíduos diferentes”.

O capitão José Fernandes também destacou a importância do trabalho de conscientização sobre a causa animal e lembrou que os resultados mais visíveis vêm a longo prazo. “É uma trabalho lento, que às vezes leva gerações, mas que, sem dúvida, já começa a gerar um efeito muito positivo”.

No encerramento do evento virtual, Eliana Malta defendeu que a humanidade adote uma visão biocêntrica e recordou que o respeito aos animais e ao meio ambiente não é apenas uma questão filosófica, mas uma questão de sobrevivência. “Vamos honrar o nome de humanos e respeitar toda forma de vida. Somos coabitantes desse espaço lindo criado para todos nós por um ser maior. Que a gente ame uns aos outros, independentemente se os outros têm penas, bico, escamas, se têm flores ou frutos. Que possamos ser seus guardiães, sua voz”.

Para acessar o guia, clique aqui.

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