Danos irreparáveis

Laiz Soares 

Danos irreparáveis

Quanto vale uma vida? Quanto você pagaria para salvar a sua vida ou de alguém que você ama? Nada poderá substituir, indenizar nem reparar a dor, o sofrimento, o impacto emocional, psicológico e social nas famílias das mais de 500 mil vítimas fatais da covid-19 neste um ano e três meses de pandemia. Estamos diante de uma tragédia sem precedentes. Não podemos naturalizar, minimizar ou relativizar algo intragável pro nosso país. É um cenário de guerra.

Qual o valor de uma indenização por uma vida que se vai por um erro ou uma negligência? No caso da tragédia do mar de lama de Brumadinho, por exemplo, tenho a impressão de que todo dinheiro que a Vale indenize as famílias será pouco perto do impacto ambiental e da destruição das centenas de vidas. Somente para ilustrar o “valor da vida”, a Justiça determinou recentemente que a Vale indenize em R$ 1 milhão cada trabalhador morto no “acidente” fruto da sua negligência e omissão. Mesmo parecendo alto para alguns, entendo como um valor simbólico, porque nada paga a dor de se perder quem se ama. Eu daria esse dinheiro, se eu tivesse, para salvar meus pais e entes amados da morte. A vida de quem a gente mais ama não tem preço. 

Está sendo provado com fatos e dados na CPI da Covid no Senado que o Estado Brasileiro, representado pelo governo federal e seus agentes, foi omisso e negligente na gestão da pandemia. Demorou a reconhecer a crise, subestimou a doença, não incentivou o uso de máscaras (pelo contrário, incentivou o não uso), promoveu aglomerações, espalhou medo e desconfiança sobre a vacina, perseguiu e ameaçou governadores e prefeitos que tentavam tomar medidas de precaução e distanciamento, e não aceitou propostas de vacina no momento certo para garantir que elas chegassem o mais rápido possível ao país, dentre outros fatos sobre os quais há provas físicas materiais em vídeos, documentos, dezenas de e-mails não respondidos, falas em público de ex-ministros da Saúde e do próprio chefe maior do Estado.  Já pensou se a Justiça determinasse que o estado brasileiro tivesse que indenizar cada vida perdida das 500 mil mortes porque a vacina não chegou a tempo por omissões, negligências e erros de gestão? Seriam bilhões de reais em indenizações. 

É pouco provável que as indenizações aconteçam, porém, as perdas para o país serão nesta proporção para mais. Com todo esse sofrimento, a pandemia trata-se de perdas e danos irreparáveis em todos os aspectos, inclusive o econômico. Milhares de pessoas se recuperaram e ficaram com sequelas graves, que vão reduzir sua capacidade criativa e produtiva na vida, fora o risco de redução da expectativa de vida e longevidade. Temos um número histórico de desempregados e, entre os jovens, nunca esteve tão alto.  O número de jovens que nem trabalham nem estudam está batendo o recorde atualmente no Brasil. Temos uma geração totalmente comprometida, que vai comprometer o futuro do país e sua capacidade de produzir e gerar riqueza. 

Economistas dizem que, apesar de uma relativa melhora e um melhor desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano puxado por uma reposição dos estoques da indústria e por alguns segmentos (como setor de alimentos, comércio eletrônico, indústria farmacêutica dentre outros), o nível de emprego não conseguirá acompanhar o crescimento econômico do país. Isso porque nossa economia é muito baseada em serviços e na informalidade (restaurantes, serviços de beleza, eventos, entretenimento), área mais afetada pela pandemia. Esses setores, além de garantirem a maior parte dos empregos, também são a porta de entrada do primeiro emprego de muitos jovens. Todas as análises de economistas e especialistas apontam que a retomada do emprego passa necessariamente pela vacinação da maioria da população, para que estes setores voltem à ativa. A demora por escolher ir atrás de vacinas, o atraso de sete meses na negociação da compra de vacinas como a da Pfizer agravou muito a pandemia no país, levando a mais mortes e a mais perdas econômicas. O governo agora entendeu e está desesperadamente correndo atrás de implorar as farmacêuticas a enviarem o quanto antes as vacinas. Tarde demais, o leite já foi derramado e os danos são irreparáveis. 

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