'Leite derramado'

Editorial - ‘Leite derramado’

A população divinopolitana teve que assistir, nesta semana, a mais um episódio lamentável dos ditos “representantes do povo”. Começou a circular nas redes sociais, último sábado, no uma imagem com a foto do deputado estadual Cleitinho Azevedo (CDN) afirmando que o parlamentar havia votado a favor de um projeto de lei sobre “ideologia de gênero”, responsável por autorizar homem a usar banheiro de mulher e vice-versa, e que multava os estabelecimentos comerciais que impedissem tal ato. Alguém com o mínimo de “maldade” possível viu de cara que isso não passava de – mais uma – notícia falsa. Não demorou muito para que a assessoria do deputado começasse a desmentir a publicação. Mas o assunto não terminou por aí e ganhou outros desdobramentos. 

O vereador Eduardo Azevedo (PSC), irmão de Cleitinho, usou a Tribuna Livre na reunião ordinária desta terça-feira para justificar o voto de Cleitinho favorável ao projeto e dizer que o irmão havia errado e lutaria para que o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), vetasse a proposta. Ontem, foi a vez de o próprio Cleitinho usar as suas redes sociais para pedir perdão e classificar o voto em favor da proposta como erro. Alguns vídeos, pronunciamentos e notas depois, a grande questão é: do que se trata de fato o projeto? Quem teve o mínimo de curiosidade de ler viu que a proposta apresentada pelo deputado estadual André Quintão (PT) apenas atualiza a Lei Nº 14.170/2002 e impõe sanções a empresas em que proprietário, dirigente, preposto ou empregado, no exercício da atividade profissional, discrimine, coaja ou atente contra direitos de alguém em razão de sua orientação sexual, identidade de gênero ou sua expressão de gênero.

No atual cenário, é sempre bom lembrar que qualquer mudança em prol das minorias é um grande avanço. Afinal, o Brasil registra uma morte por homofobia a cada 23 horas. Só no ano passado, 237 pessoas tiveram morte violenta relacionada à sua orientação sexual ou identidade de gênero. E os pedidos de perdão, os vídeos, as notas e os pronunciamentos só nos levam a outros dois questionamentos. O primeiro: o deputado e sua assessoria não leram o projeto de lei que foi protocolado na Assembleia Legislativa? Ele não representa os LGBTQi? Não vê como justa a causa e como  é coerente o projeto? De que adianta falar em vídeo que não é contra ninguém, quando se afirma, na mesma gravação, que pedirá para que a proposta seja vetada? O representante é do povo ou de parte dele? De que adianta pedir perdão, quando se fecha os olhos para dados tão assustadores? 

Defender a família tradicional brasileira é sem sobra de dúvida, louvável, mas não se pode fechar os olhos para crimes tão horrendos e assustadores. A sensação que se tem é que chorar pelo leite “derramado” é mais fácil do que assumir as consequências do voto atribuído e  voltar o olhar apenas para algumas parcelas da população. No Brasil está sendo mais fácil ser político de rede social do que ser de fato representante do povo e legislar em prol de todos. 

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